São Paulo, sábado, 25 de janeiro de 1997
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Faap inaugura "sala de aula" em Paris

CASSIANO ELEK MACHADO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A mais nova sala de aula da Faap fica a poucos metros da catedral de Notre Dame. Nessa classe não há professor ou quadro-negro, e o espaço é ocupado por apenas um aluno a cada seis meses.
Até 22 de março do ano 2060, a Fundação Armando Álvares Penteado, que completa 50 anos em 97, tem direito de ocupar um ateliê na Cité des Arts -Cidade das Artes, em português-, espécie de condomínio que reúne artistas plásticos e músicos do mundo inteiro desde 1965, em Paris.
A cada semestre, o espaço será ocupado por um aluno, professor ou ex-aluno da universidade que desenvolva um trabalho artístico.
O paulistano Marco di Giorgio, 24, é o primeiro "faapiano" em Paris. Aluno do último semestre do curso de licenciatura em artes plásticas, Di Giorgio foi escolhido entre os 2.000 alunos da faculdade.
Maria Isabel Ribeiro, diretora do Museu de Arte Brasileira da Faap, explica que Marco se destacou desde a primeira exposição da qual participou, a mostra coletiva Circuito Interno.
Além do ateliê na capital francesa, o artista, que embarca no dia 2 de fevereiro, recebe também uma bolsa de cerca de R$ 1.000, equivalente ao que gastaria na faculdade neste semestre.
Cogumelos
Di Giorgio conta que imaginava que seria engenheiro. Começou a pintar incidentalmente, como uma espécie de terapia após uma intoxicação com cogumelos alucinógenos.
Começou com a pintura acadêmica, que, em pouco tempo, tomou contornos contemporâneos. A obra de Di Giorgio se destaca pelo diálogo incessante entre a fotografia e a pintura.
Suas construções têm como ponto de partida imagens próximas, recolhidas em retratos de familiares, da própria infância e de alguns amigos.
Além de servir como fonte de inspiração iconográfica, a fotografia se infiltra nas pinturas como técnica.
Em sua linha de trabalho mais conhecida, o artista brinca com a arte naif, nome adotado para designar as telas de inspiração popular, criadas pelos chamados artistas ingênuos.
Di Giorgio cria uma paisagem bucólica, com casinhas, árvores mirradas e flores em tons rosados, sobre a qual introduz figuras tênues, quase imperceptíveis, que geralmente são apelidadas de "fantasminhas" pelo público.
"Essas paisagens eu trago do inconsciente", conta Di Giorgio, que confessa que odeia São Paulo e que gostaria de morar em uma das cenas que pinta.
O artista tem menos de três anos de carreira, mas já levou essas telas para terrenos nobres da arte contemporânea.
Em 95 participou de exposição da galeria Luisa Strina. No ano seguinte, realizou a primeira mostra individual, na galeria carioca Thomas Cohn, e foi um dos 62 escolhidos entre artistas do Brasil inteiro para a exposição "Antarctica Artes com a Folha".
Atualmente, continua desenvolvendo o intercâmbio contínuo entre a fotografia e a pintura.
A partir de um acetato, utiliza os pincéis para releituras de pinturas que havia realizado em recriações de fotografias. Di Giorgio conta que continua a desenvolver esse "pingue-pongue" em Paris.
Seu material artístico não viaja com ele. Além do francês conquistado em três meses de aula, Di Giorgio leva apenas seus pincéis.
Enquanto não embarca, o artista continua produzindo incansáveis pinturas e juntando dinheiro para participar da megaexposição espanhola Arco'97, para a qual foi convidado.

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