São Paulo, sábado, 25 de janeiro de 1997
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Letras e artes

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Entrevistado esta semana por Pedro Bial num canal da Net, fui perguntado sobre a sobrevivência dos gêneros literários. Mais precisamente: com a predominância e abrangência da linguagem audiovisual, haveria espaço para romances, contos, ensaios, para a linguagem literária?
Sem vocação nem gosto pelo ofício de profeta, respondi que sim, embora em escala cada vez menor e mais seletiva. Mas não pela decantada hegemonia do audiovisual, que está com seus dias contados e que, provavelmente, desaparecerá nos primeiros anos do próximo milênio.
Pode parecer um paradoxo, mas vamos lá ao raciocínio. A literatura vem lá de trás, tem uns sete ou oito mil anos nas costas. O audiovisual, cujo emblema maior é o cinema, tem pouco mais de cem anos. Mas logo será superado pela linguagem virtual, que é realmente um ponto acima, um "plus" em relação à linguagem audiovisual.
Desse susto, a linguagem literária não morrerá. Dou um exemplo: daqui a dez anos, se tanto, é possível que um grupo de jovens faça uma versão de "O Guarani" com Humphrey Bogart no papel de Peri e Greta Garbo no papel de Ceci. Por pior que seja, será mais atraente do que a versão de Norma Bengell. Apesar disso, não afetará os poucos leitores que continuarão apreciando o clássico de José de Alencar.
As grandes produções de hoje, que custam milhões de dólares, serão acessíveis a pequenos grupos e até a indivíduos que dominarem a linguagem virtual.
Já existe uma estrada (a Internet) que pode absorver toda essa produção individual. A tendência é ampliar essas vias e tornar os recursos mais baratos.
Volta-se então à estaca zero. Um jovem de 18 anos pode escrever sozinho e virtualmente sua história usando personagens, músicas e efeitos especiais que hoje são impossíveis de serem produzidos no audiovisual tradicional. Enquanto isso, a literatura, modestamente, irá bem, obrigado.

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