São Paulo, sexta-feira, 31 de janeiro de 1997
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Comédia revela o sublime e o ridículo dos personagens

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Não é difícil entender o sucesso de "Pequeno Dicionário Amoroso". Apesar de seus vários problemas, é um filme simpático, vibrante, encantador.
Seu tema -o relacionamento amoroso- é universal, mas, da maneira como é tratado no filme, fala particularmente de perto aos neuróticos de classe média das grandes cidades.
A estrutura é fragmentada e esquemática. Acompanha-se a evolução do relacionamento de um casal de personagens, a arquiteta Luísa (Andréa Beltrão) e o biólogo Gabriel (Daniel Dantas), entremeada com depoimentos para a câmera dos próprios personagens e de dois de seus amigos (Tony Ramos e Mônica Torres).
Fórmula
Esses últimos, repetindo a fórmula dos curtas de José Roberto Torero (um dos roteiristas), apresentam estatísticas disparatadas e comparam "cientificamente" o comportamento humano ao de outros animais.
Há um certo humor fácil, de professor de cursinho, nesses depoimentos, mas não é aí que reside o encanto do filme, e sim na delicadeza com que revela o ridículo e o sublime de seus personagens.
O maior mérito, aqui, talvez seja o da soberba interpretação dos atores. Daniel Dantas atinge uma naturalidade notável ao optar pelo despojamento, restringindo ao mínimo sua gama de expressões.
Andréa Beltrão é um caso à parte. Se já era uma atriz charmosa e competente, a maturidade tornou-a uma jóia rara e lapidada. Sua presença na tela magnetiza e emociona o espectador.
Em termos narrativos, "Pequeno Dicionário" peca por se acomodar um pouco a sua estrutura esquemática e algo redundante.
Toda vez que busca soluções narrativas criativas, o filme cresce.
Dois momentos são exemplares. Na cena em que Luísa e Gabriel tentam falar um com o outro por telefones celulares, sem saber que estão no mesmo prédio, a câmera os mostra primeiro em planos alternados.
Quando a ligação telefônica se completa, a câmera se eleva de um para o outro, criando subitamente um espaço comum para os dois. A ascensão da câmera indica uma epifania ou revelação.
Em outra passagem, vemos Luísa encolhida no chão e, em fusão, a imagem dela discutindo com Gabriel.
Depois de um tempo, as duas imagens se fundem em Luísa sentada, como se seu espírito se libertasse da lembrança perturbadora e pousasse em seu corpo. Isso é cinema, belo cinema.
(JGC)

Filme: Pequeno Dicionário Amoroso
Produção: Brasil, 1996
Direção: Sandra Werneck
Com: Andréa Beltrão, Daniel Dantas, Tony Ramos, Mônica Torres
Quando: a partir de hoje nos cines Espaço Unibanco 2 e 3, Eldorado 5, Lumière 1, Morumbi 2, Olido 2, Paulistano, Butantã 3 e Market Place 3

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