São Paulo, quinta-feira, 2 de outubro de 1997
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São Paulo e Deus

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Bem que a Folha avisou no domingo: com o fim do rodízio e a perspectiva de chuvas fortes, São Paulo ia se afogar (em água e carros parados). Não está dando outra.
Na prática, o paulistano, outrora orgulhoso de ser supostamente cosmopolita, comporta-se agora como os antigos sertanejos, aquele pessoal que vê o filho morrer, barriga inchada de vermes, e tudo o que faz é emitir um muxoxo conformista: "Deus quis, né?".
Assim estamos os paulistanos. Na segunda-feira, ao sair da Folha para casa (na zona sul), tive que subir a avenida da Consolação, dado que todos os acessos às avenidas que levam à zona sul estavam entupidos.
Para quem não conhece a cidade, a Consolação vai do centro ao início da zona oeste. Ainda assim, me pilhei feliz no carro, porque o trânsito até que fluía razoavelmente.
É ou não um conformismo estúpido dar-se por feliz em ver o trânsito andar um pouco, apesar de ser obrigado a tomar rumo oeste quando queria ir para o sul?
Aí, ontem, a Folha informou que a Polícia Militar aconselha seu pessoal a não andar fardado fora do serviço, nem que seja no caminho de casa para o trabalho e vice-versa. Tudo para não atrair a ira ou a cobiça dos ladrões.
Suspeito que essa notícia será vista como se fosse apenas um aspecto pitoresco da crise da segurança pública.
Não é. Quando a polícia, e não o delinquente, é obrigada a cair na clandestinidade, a esconder sua face mais visível (o uniforme), é porque Estado e sociedade capitularam vergonhosamente ante o banditismo.
Deus quis assim? Não consegui encontrá-lo até o fechamento desta edição, para poder conferir. Mas duvido. Quem quis assim foi uma penca de governantes ou absolutamente incompetentes ou com as prioridades absurdamente equivocadas.
Agora, com tanta desgraça chovendo sobre a cidade, desconfio que até Deus teria dificuldades para dar um jeito.

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