São Paulo, domingo, 5 de outubro de 1997
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O risco está em 98

CELSO PINTO

O déficit externo em conta corrente dos países latino-americanos, que chegou a US$ 36 bilhões no ano passado, deverá saltar para o recorde de US$ 61 bilhões neste ano e US$ 79 bilhões em 98.
Nunca a região precisou de tanto dinheiro para fechar suas contas. O déficit recorde anterior foi de US$ 49 bilhões, em 94. Mesmo nos países asiáticos emergentes (excluídos Japão, Austrália e Nova Zelândia), o déficit recorde foi de US$ 49 bilhões, no ano passado.
Embora em termos relativos o déficit latino-americano não seja extraordinário (3,2% do PIB neste ano e 3,9% no próximo), em valores absolutos ele é. Não fosse o forte ingresso de investimentos diretos, provavelmente haveria dificuldades para financiá-lo neste ano. No próximo, "os números são muito grandes, e ele pode acabar não sendo financiável".
A análise é do economista Arturo Porzecanski, do Banco ING Barings em Nova York, um dos mais respeitados analistas de América Latina entre os bancos internacionais. Numa palestra recente a investidores em Nova York, Arturo discutiu as chances de haver uma crise monetária na América Latina, a exemplo do que ocorreu na Ásia. Suas conclusões são bastante interessantes.
Ele está otimista em relação a este ano e descarta qualquer crise monetária. Para 98, contudo, o cenário muda: será mais difícil atrair tantos dólares, as reservas cambiais vão cair, e as moedas de vários países serão desvalorizadas.
Em relação ao Brasil, ele imagina que o governo resistirá a qualquer pressão para desvalorizar mais fortemente o real até a eleição presidencial de outubro, elevando os juros e impondo controles cambiais, se necessário. Ele aposta que o alto volume de reservas e as privatizações serão suficientes para resistir a qualquer ataque especulativo.
São três as razões para otimismo neste ano. Primeiro, uma enxurrada de boas notícias. O crescimento médio deve chegar a 4,5% neste ano e a 5% no próximo. Nos últimos 15 anos, apenas em 94 a região cresceu acima de 5%. A inflação média, que pode chegar a um dígito neste ano, é a menor em 25 anos. O volume de investimentos diretos deve chegar ao recorde absoluto de US$ 43 bilhões neste ano, quatro vezes maior do que em 93.
A segunda razão para otimismo é o volume recorde de reservas cambiais da região: US$ 175 bilhões. A terceira é que é improvável que haja aumentos significativos nos juros internacionais neste ano. Somando essas razões, entende-se porque muitas moedas na região, especialmente as do Chile e do México, se valorizaram neste ano.
Em 98, contudo, a situação complica. A expansão mundial monetária e das reservas já está mais lenta, e a liquidez mundial deve ser reduzida em 98. O Japão deve começar a se recuperar, e seus juros poderão subir. A Alemanha deve elevar os juros, até como forma de apoiar a nova moeda européia, o "euro". Os juros poderão subir, também, nos Estados Unidos.
Ele teme que um aquecimento nas economias latino-americanas pressione ainda mais o nível recorde de déficits em conta corrente. Do lado político, a maioria governista desapareceu no México e deve acabar na Argentina. Brasil, Colômbia, Equador e Venezuela terão eleições presidenciais, e isso gera incertezas e, talvez, pressões de gastos.
Finalmente, ele acha que o rendimento dos papéis latino-americanos caiu demais, enquanto as bolsas subiram bastante. O interesse dos investidores, portanto, deve diminuir.
Tudo isso deve reduzir a oferta de dólares e o volume de reservas e gerar pressões por desvalorizações. Arturo acha que no Chile, Colômbia, México, Peru e Venezuela os governos deverão aceitar de bom grado essas pressões e deixar suas moedas se desvalorizarem mais rapidamente. As duas exceções seriam a Argentina, que tem a paridade fixada em lei, e o Brasil.
A pedra do Meridional
Para o banco espanhol Bilbao Viscaya comprar o BCN, falta apenas acertar-se com o Banco Central, que quer empurrar o Meridional como "pedágio". Quando esteve para ser vendido, recentemente, o Meridional foi avaliado em R$ 200 milhões. Hoje, quem conhece a situação do banco diz que ele está perdendo R$ 20 milhões por mês e não vale mais do que R$ 50 milhões.
Se houver acerto, o negócio sai.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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