São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 1997
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Lei sobre aborto gera crise com igreja no Rio

MÁRIO MOREIRA
DA SUCURSAL DO RIO

A lei sancionada pelo governador do Rio, Marcello Alencar (PSDB), determinando que os policiais das delegacias informem às mulheres estupradas que elas têm direito de abortar provocou uma crise entre Alencar e o cardeal-arcebispo do Rio, d. Eugenio Sales.
A Arquidiocese do Rio divulgou ontem uma nota oficial em que d. Eugenio diz que a promulgação da lei é um "agravo a João Paulo 2º, que veio até nós".
Para d. Eugenio, o papa, que condenou o aborto em sua passagem pelo Rio, "não merecia esse procedimento nem a coincidência da aprovação da lei".
Na nota, o cardeal chama o aborto de "crime hediondo" e afirma que "ninguém é obrigado a obedecer a essa lei, contra sua consciência".
O estupro é um dos casos em que o Código Penal permite a realização de aborto no Brasil. O outro caso em que o aborto é permitido é quando a mãe corre risco de vida por causa da gravidez.
A lei 2.802 determina que cada delegacia do Estado do Rio apresente à vítima de estupro uma relação de hospitais preparados a fazer o aborto de forma legal, com os respectivos endereços.
O artigo 2º diz que o médico só poderá fazer o aborto com o consentimento da gestante ou, caso ela esteja incapaz, de uma pessoa que a represente.
Afronta
O cardeal disse ter comunicado à comissão organizadora da vinda do papa ao Rio que não aceitaria colaboração financeira do governo para cobrir as despesas da visita, "mesmo que o governador assim se dispusesse a fazer".
"Seria uma afronta ao papa e a nós, católicos. A providência divina nos ajudará de outra maneira", disse d. Eugenio.
No começo da noite, Marcello Alencar respondeu com outra nota oficial, em que lamenta o "tom intempestivo e destemperado" do cardeal.
Confusão
O governador afirmou estranhar que d. Eugenio tenha se manifestado sobre a lei somente agora, e não durante a tramitação do projeto na Assembléia Legislativa.
O projeto original era da deputada Alice Tamborindeguy (PSDB).
"Há também uma grande confusão. Não sancionei nenhuma lei legalizando o aborto, e sim uma lei que esclarece e orienta as vítimas de estupro quanto ao procedimento específico a respeito de um dispositivo previsto no Código Penal", afirmou Alencar.
O governador afirmou, ainda, ter "grande apreço" por d. Eugenio, mas disse que ele "deve ter confundido suas funções episcopais com as do chefe do Executivo estadual".

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