São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 1997
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A Petrobrás e a realidade

A Petrobrás não vê zonas de sombra no contrato que possam dar margem a conflitos interpretativos
JOEL MENDES RENNÓ
A polêmica sobre o contrato entre Petrobrás e OPP Petroquímica, no âmbito do Complexo Petroquímico do Planalto Paulista, é típica do caso em que se somam a desinformação técnica, o julgamento precipitado e a avidez pela crítica a qualquer preço, em um cenário de concorrência empresarial forte e emergente.
A sociedade está no direito de acompanhar, por seus órgãos representativos, a nova fase da Petrobrás, agora sob a égide da abertura da política petrolífera nacional, consubstanciada na emenda constitucional nº 9/96 e na lei 9.478/97. Esse acompanhamento, entretanto, precisa estar sempre alinhado ao rigor dos fatos, liberto do preconceito e da suspeita fantasiosa.
Ao negociar, com empresas nacionais de competência, parcerias no setor petroquímico, a Petrobrás cumpre roteiro que tem o seu ponto de partida nas determinações da referida lei e busca o atendimento pleno de exigências fundamentais do nosso desenvolvimento.
Contrariamente ao que interpretações tendenciosas apregoam, em lugar de pretender retomar prerrogativas monopolistas que nunca lhe pertenceram, mas só à União, a companhia procura participar da indústria petroquímica (ultrapassada a fase do modelo tripartite, pré-privatização das participações da Petroquisa) na condição de associada minoritária, que vem acrescentar seu apoio ao investimento privado brasileiro.
Tampouco se trata de bafejar contraposições ao investimento estrangeiro. Estamos precisamente abrindo-lhe as portas na única área até há pouco interdita à sua imprescindível participação, a das atividades do petróleo.
No projeto do complexo petroquímico do Planalto Paulista, assim como nos do Rio, Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul, o que está em causa é a composição do equilíbrio entre forças produtivas nacionais e multinacionais.
Na petroquímica nacional de hoje, cerca de metade do ativo industrial pertence a mãos estrangeiras, o que pode transmitir a impressão de perda de capacidade de inversão e de concorrência dos nossos empresários, em uma direção oposta ao que já realizaram no histórico do setor.
A política estratégica do governo federal visa estimular ou patrocinar a criação de empresas petroquímicas brasileiras fortes, competitivas em nível industrial. Contribuindo com o setor, a Petrobrás, portanto, está na diretriz certa.
O Complexo Petroquímico do Planalto Paulista representa apenas mais um passo à frente. A Petrobrás já viabilizou com outros sócios o Pólo Petroquímico do Rio, participa da duplicação do Pólo Petroquímico do Sul (Copesul) e desenvolve trabalhos para o aumento da capacidade da Copene, na Bahia, e do atual Pólo Petroquímico de São Paulo.
Respaldada no modelo de flexibilização do monopólio, de acordo com decisão do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e conforme orientação do ministro de Minas e Energia, Raimundo Brito, a Petrobrás tem o dever de atuar objetiva e pragmaticamente dentro da nova realidade.
Nem por isso, porém, as parcerias que já está negociando ou ainda projetando dispensam as cautelas e o período de maturação necessários.
Transcorreram inúmeros meses de análises e entabulações até que fosse assinado o contrato com a OPP, com a interveniência do Grupo Ultra e da Elekeiroz. O mesmo ocorreu com relação ao Pólo Gás Químico do Rio. Nada se fez em segredo. E, apesar da total transparência, nenhum protesto -nem sequer a mínima ressalva- adveio de empresários que hoje se declaram surpreendidos e discriminados.
Para bem compreender o contrato, cumpre levar em conta que a moderna petroquímica é uma indústria de escala intensiva de capital, cujo grau de competitividade depende, além desses fatores, da amplitude geográfica de atuação e do constante processo de aprimoramento em eficiência e qualidade.
Ao mesmo tempo, a simples abertura do mercado e a nossa crescente integração com a economia mundial passaram a reclamar de determinados setores da economia, e não somente do petroquímico, a formação de empresas brasileiras com padrões de escala e de competitividade compatíveis com os de corporações líderes internacionais.
Todavia, o faturamento dos centros petroquímicos do país está entre US$ 10 bilhões e US$ 11 bilhões anuais (2% do mercado global). Sozinha, a multinacional Dow Chemical fatura mais do que o dobro da nossa petroquímica.
A estratégia nacional não perdeu sentido com a globalização. As mudanças nas dimensões do mercado impõem visão mais ampla do nosso horizonte de desenvolvimento. Discutir apenas a divisão do mercado interno é perder a perspectiva da competição mundial.
Registre-se ainda, como fator da maior importância, que a estabilização promovida pelo Plano Real abriu nova expansão de demanda dos produtos do setor e, simultaneamente, intensificou as pressões concorrenciais externas.
O contrato em tela, destinado à implementação do complexo petroquímico referido, envolve investimentos com 70% de capital privado e não foi celebrado para estabelecer os termos de uma parceria em outro planeta, regiões remotas da terra ou outros limites do território brasileiro.
O primeiro empreendimento do novo complexo será um projeto de produção de polipropileno, e a energia elétrica que abastecerá o novo pólo será fornecida por central termelétrica a ser construída no local.
A Petrobrás, como reiterou à imprensa o ilustre ministro Brito, não vê zonas de sombra no contrato que possam dar margem a conflitos interpretativos.
O país quer grandes empresas nacionais no setor petroquímico, mas dentro da diversificação própria de um mercado livre e globalizado.
Inadmissível é estar a mencionada parceria sob o cerco de interesses corporativos, usando as armas da aparente desinformação e da má-fé. A Petrobrás é uma história de 44 anos de construção, de experiência, seriedade, alta capacitação operacional e tecnológica, prestígio internacional, níveis de excelência em muitos campos de atuação e resultados acima de quaisquer dúvidas ou suspeitas.
Por isso, os investidores estrangeiros atraídos pela abertura do setor petrolífero respondem a uma tendência natural de procurar a companhia para empreendimentos associados.
O processo de perda de exclusividade da Petrobrás no exercício concessionário do monopólio constitucional da União contou, desde o primeiro momento, com o empenho da estatal.
Reduz-se assim a uma invencionice absurda a identificação, nesta altura, de manobras e interesses de resistência da companhia aos desafios da competição e a aleivosia de que ela se tornou submissa ou atrelada a empresas parceiras.
O perfil correto da Petrobrás é o de uma instituição indutora do desenvolvimento brasileiro, rigorosamente dentro da lei e das prescrições dos órgãos do governo federal ao qual está vinculada. A Petrobrás opera estritamente no plano da realidade brasileira. Não no reino da fantasia mal-intencionada e irresponsável.

Joel Mendes Rennó, 59, engenheiro, é presidente da Petrobrás (Petróleo Brasileiro S/A).

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