São Paulo, segunda-feira, 13 de outubro de 1997
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Previsão: problema no amor e na conta telefônica

GUSTAVO IOSCHPE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nada mais natural do que a curiosidade humana de conhecer o futuro. Não só por razões práticas, como ganhar na loteria ou evitar o casamento com alguém que vai virar naturalista e comer apenas broto de bambu e arroz com casca, mas simplesmente pela aflição de saber que seus planos vão dar certo etc.
O que não dá pra entender são as pessoas que acreditam naquelas cartomantes de 300 kg, sentadas dentro de pirâmides ("para atrair a energia do cosmos"), ou naqueles horóscopos de revista feminina ("cuide para não desprezar o girino de hoje, pois ele pode ser o príncipe de amanhã").
Quer dizer, se uma pessoa pode antever os acontecimentos, não seria de esperar que ela estivesse milionária, ganhando na loto, e não ruminando dentro de uma pirâmide com aqueles pijamas ridículos?
Se você levar em consideração todas as incertezas, inseguranças e o excesso de curiosidade das pessoas, talvez até possa entender essas incursões no terreno do oculto e se solidarizar com elas. O que não dá pra entender mesmo é o recente sucesso de cartomantes e tarólogos que atendem por telefone -eles chegam ao Brasil depois de muito tempo de sucesso aqui.
Porque esse negócio de vidente por telefone tira tudo o que havia de possivelmente atraente nos videntes ao vivo, que é o lado exótico, esdrúxulo. Não imagino o que leve alguém a confiar em um suposto mágico (já que vê o futuro), sem ao menos poder olhá-lo de frente e tentar perceber aquele sorriso sacana quando ele prevê que você vai encontrar um milionário norueguês e tal. Por telefone, pô, não dá pra saber nada. E se o cara tá tomando um cafezinho e derruba em cima do seu mapa astral?
- Ih, tem uma mancha negra na sua vida! Na verdade, você morreu há cinco anos.
Fora todos os tipos de problema que podem resultar simplesmente da nossa péssima infra-estrutura telefônica. Tipo: linha cruzada.
- E a minha vida sexual, como é que fica?
- Tá pegando fogo, vem logo! Vai explodir, vai explodir!
- Ai, meu Deus! Obrigada!
- Pera aí, moça. Quem é que tá falando? Não é dos bombeiros?
Mas o provável é que tudo dê certo e que os videntes consigam sugar todo o seu dinheiro. Não que eu os ache charlatões, longe de mim. Seu método é infalível e já vem com a vantagem de ter sido testado com os americanos -sabidamente mais exigentes. Pode ficar tranquilo, tudo acaba dando certo.
- Os astros estão me dizendo aqui para você tomar cuidado com algumas pessoas que são muito especiais na sua vida enquanto for lua cheia.
- Quem? Quem?
- Seu irmão.
- Meu irmão? Mas eu sou filha única!?
- Não, quer dizer, aquelas pessoas que você considera como irmão, quer dizer, no sentido metafórico, metafísico, metatexto, metassexual, assim, sabe...
- Mas que história é essa? Eu sou homossexual.
- (Silêncio). (Barulho de alguém chamando o supervisor). Não pode ser, não bate.
- Como "não bate"?
- Ah... Você nasceu mesmo no dia 19 de janeiro de 1974, às 18h46?
- Siiiim, pela décima vez.
- (Longo silêncio). (Alguém tapa o bocal, mas ouvem-se cochichos). Aaashh, santa, já sei! É que era horário de verão. Vamos começar de novo, então...
(Ao fundo, suspiros de alívio).

fala-bagual@geocities.com

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