São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 1997
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Frank O. Gehry une arquitetura e arte em Bilbao

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O arquiteto canadense Frank O. Gehry inaugura oficialmente amanhã, em Bilbao, no País Basco, o museu Guggenheim Bilbao, um marco da arquitetura neste final do século e principal ponto de revitalização econômica, social e cultural da região espanhola.
Em entrevista exclusiva à Folha, de Los Angeles, a primeira concedida a um jornal brasileiro, Gehry falou sobre democracia, arte e sua nova obra-prima.
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Folha - Você acredita que um prédio possa se tornar uma escultura, uma obra de arte?
Frank O. Gehry - Eu acho que existem prédios no mundo que são obras de arte. A igreja de San Carlino, em Roma, de Borromini, é uma obra de arte. Eu acho que é possível fazer de um prédio uma obra de arte e também acho que a arquitetura é uma grande arte.
Folha - Você citou San Carlino. Você tem um interesse particular pela arquitetura barroca?
Gehry - Eu tenho interesse por todas as arquiteturas. O problema é que a maioria dos prédios que são construídos no mundo não são arquitetura. São apenas prédios. Eu acho que 99% da paisagem arquitetônica são apenas prédios, criados como disputa de forças econômicas, decisões empresariais e de marketing e não como uma elevação do espírito.
Você tem que distinguir essa produção daquilo que foi feito pelos heróis do passado, como Le Corbusier, Alvar Aalto, Frank Lloyd Wright, Mies van der Rohe, Oscar Niemeyer. Eles fizeram arte.
Folha - Você acha que seus projetos estão nesse 1% restante? Gehry - (risos) Eu não posso reivindicar isso. Eu tento fazer o melhor, mas cabe aos outros dar esse juízo. Posso apenas assegurar que eu estou tentando fazer arte.
Folha - Você tem usado imagens para descrever seus projetos, como "uma rosa explodindo", para o Disney Concert Hall, e "uma flor metálica", para o teto do museu Guggenheim Bilbao. Essas imagens são criadas a priori?
Gehry - São imagens posteriores: um peixe, uma flor, Ginger e Fred... Não são imagens conscientes. Minha produção é perpassada pela minha experiência visual em vários níveis. Estou interessado em encontrar uma arquitetura que se expresse mais em sentimentos e emoções. Quando alguém estiver em um edifício meu, passar por ele, olhá-lo, existirá sempre um convite para uma participação em suas características visuais.
Estou tentando fazer uma arquitetura que se adapte ao ser humano, de uma maneira que represente mais seu modo de vida, por meio de movimentos, emoções, sentimentos de exuberância. Apesar de difícil, a paixão pode ser transmitida para os projetos.
Folha - A idéia de conforto é importante ou você acha que beleza e impacto impressionam mais?
Gehry - Eu acho que conforto é muito importante e acho que se você estiver dentro de um dos meus edifícios também vai achá-los confortáveis. Meus trabalhos se relacionam com o local onde se encontram. Se você for até Bilbao, verá isso. Ele envolve a cidade. Meus trabalhos não se resumem a um belo desenho, mas lidam com relações entre materiais, necessidades e o local escolhido. Se você olha um edifício sem essas correlações, não o compreenderá.
Los Angeles tem sido um tipo de fronteira para a democracia americana. A cidade trata de pluralismo e liberdade de escolha. É interessante observar como a democracia construiu cidades caóticas e difíceis de compreender, mas isso é um dado da época em que vivemos. Tentei entender isso e fazer uma arquitetura que utilizasse os sentimentos e as forças dos ideais democráticos. Eu gosto de projetar edifícios que sejam abertos e acessíveis, onde as pessoas se sintam confortáveis e não pressionadas.
Folha - Não é difícil falar de democracia em um setor que envolve poder econômico, de grandes empresas ou do Estado?
Gehry - A democracia trabalha para todos. Sem esses elementos que você menciona não existiria trabalho. Ainda não fui convidado para projetar uma favela, mas já projetei residências e gostei muito. Não gosto de projetar casas de milionários. Se você olha o meu currículo pode perceber que fali miseravelmente nesse campo.
Folha - Guggenheim Bilbao é seu projeto mais importante?
Gehry - Todo projeto é o mais importante quando estou trabalhando nele. Guggenheim, sem dúvida, foi uma bela experiência.
Folha - O que mais lhe interessa nesse projeto?
Gehry - A população do País Basco tem uma cultura especial, que me atraiu muito, e sonha em transformar Bilbao em uma meca da cultura mundial para a arte contemporânea com esse edifício. Foi um trabalho que exigiu uma equipe coesa que trabalhou unida durante vários anos. Somos uma família hoje e estou muito triste com a finalização do projeto.
Folha - Existe algo no museu que lhe agrada mais?
Gehry - Gosto da maneira visionária como ele eleva a arte. É um edifício muito forte, onde a arte está muito bem. Isso me dá muito prazer.

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