São Paulo, sexta-feira, 17 de outubro de 1997
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Geisel e as bruxas

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Como os espanhóis, "no creo en brujas, pero que las hay, las hay".
A bruxa, no caso, é a tentação autoritária, claramente manifestada no livro com declarações do general Ernesto Geisel, ontem resumido por esta Folha. "O que deram as eleições diretas no Brasil? Collor e Itamar", dizia o ex-presidente, já morto.
Primeiro, é de uma monumental injustiça com Itamar Franco equipará-lo a Fernando Collor. Segundo, cabe inverter a pergunta. Assim: o que deram as eleições indiretas no Brasil?
Respostas múltiplas:
1 - Deram, por exemplo, em presidentes como João Baptista de Figueiredo, que teve de sair do palácio pela porta dos fundos. Ou como o governador do Paraná, Haroldo Leon Peres, expelido, por corrupção, pelos mesmos generais que o haviam nomeado.
2 - Deram, por exemplo, em uma coleção de mandatários que autorizaram ou, no mínimo, toleraram torturas, assassinatos de oposicionistas e um punhado de outras violações aos direitos humanos.
3 - Deram, por exemplo, em incontáveis cassações de mandatos e de direitos políticos, castrando toda uma geração que, se as regras fossem democráticas, teria certamente oxigenado o ambiente político.
4 - Deram, também, em Fernando Collor, afinal um filhote da ditadura. Como, aliás, inúmeros outros políticos hoje no governo ou no Congresso, cuja carreira teria sido eventualmente interrompida (ou nem teria se iniciado) se alguns de seus adversários não estivessem condenados à morte política pelo regime militar.
Torço para que as bruxas estejam definitivamente desterradas do cenário político, mas, para exorcizá-las com um argumento econômico, convém lembrar que, hoje, a democracia não é apenas um ativo institucional, mas um ativo econômico.
Já passou, pois, da hora de enterrar Geisel de uma boa vez, junto com a nefanda tentação autoritária.

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