São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Mapa de São Paulo mudou nos anos 60

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

O mapa urbano de São Paulo começou a mudar radicalmente em 1966. A abertura, naquele ano, do Shopping Center Iguatemi -o primeiro da cidade- foi uma boa notícia para alguns, uma péssima para muitos outros.
Vejamos um pouco de história. O burgo medieval era a concentração de ofícios em torno da casa do bispo.
As grandes feiras européias anuais, a partir dos séculos 12 ou 13, corresponderam à predominância dos interesses do comércio regional sobre o dos fabricantes.
As cidades, esvaziadas na Europa Ocidental após o desmembramento do Império Romano, voltaram a crescer. Os muros fortificados protegiam as pessoas -contra a peste, contra exércitos estrangeiros- mas também contra os concorrentes de comerciantes locais que não pagariam impostos.
As grandes cidades brasileiras também se fortificaram. Mas seus muros não têm um perímetro geográfico definido. Eles foram erguidos ao redor dos shoppings.
O processo foi lento e teve uma fase intermediária. No fim dos anos 50, a rua Augusta tentou -e conseguiu- se impor como modismo, em detrimento das ruas Vieira de Carvalho, Sete de Abril ou Barão de Itapetininga.
Mas a rua Augusta era local aberto. Se as butiques eram caras, as calçadas permaneciam ao alcance de qualquer um.
Nos shoppings, a segurança não deixa entrar ambulante ou pedinte. Eles funcionam como uma versão ampliada dos clubes que, até o início dos anos 60, eram o único espaço em que a classe média alta conseguia se enclaustrar.
Essa mesma classe mais abastada, proprietária do poder político local quando o regime militar dava outro contorno aos poderes regional e federal, desertou o centro da cidade e deixou de exercer seu poder sobre ele.
Esse poder não é abstrato. Ele se manifesta de maneira concreta. Os mais ricos exigem comércio de produtos refinados, bons restaurantes, boas livrarias, cinemas em que o ar-condicionado funciona.
Exigem também limpeza nas ruas, policiamento competente, flores nos canteiros dos calçadões.
O modelo instituído pelos mais ricos foi em seguida copiado pelas classes médias mais "média" e mais baixa. Outros shoppings em outros bairros mais modestos drenaram o comércio de rua local.
O centro não se degrada nas cidades em que os ricos mantêm certo poder urbano.
A América Latina possui dois exemplos de cidades onde isso aconteceu. São elas Buenos Aires e Santiago do Chile.
São dois lugares em que há shopping centers também. Mas a função deles é outra. Servem como centro de compras. Aliás, deve ser justamente essa a tradução dessa expressão que há muitos anos pertenceu à língua inglesa.

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