São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ajuste cambial não condena modelo asiático

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Corrupção, fraudes financeiras, autoritarismo político, especulação imobiliária. A lista de defeitos atribuídos ao "modelo asiático" não pára de crescer, acompanhando as rodadas sucessivas de desvalorização cambial. Para arriscar uma previsão sobre o futuro da região, entretanto, é preciso entender se o modelo é de fato a causa da crise ou se, ao contrário, é o modelo que permitirá a saída da crise.
Há uma tendência em alguns meios à condenação do modelo, tendência que ficou evidente já na reunião anual do Fundo Monetário Internacional em Hong Kong. Curiosamente, foi o próprio Banco Mundial que publicou há poucos anos um portentoso relatório elogiando o "milagre" do Sudeste Asiático.
Duas características do modelo de desenvolvimento rápido foram sublinhadas pelo Banco Mundial: o investimento em educação e a montagem de plataformas exportadoras. Esse investimento não se desintegra quando alguns bancos e empreiteiras quebram ou quando um governo cai.
Tailândia não é China
Outra ressalva importante é análoga à que se fazia na América Latina quando estourou a crise mexicana. Cada país da região, em especial Brasil e Argentina, insistia em se mostrar "diferente" do México. Passado o sufoco, que incluiu mudanças no mecanismo cambial no Brasil e uma profunda recessão na Argentina, a vida continuou. Não são modelos perfeitos e os riscos de novas mudanças são evidentes. Mas a catástrofe regional que muitos esperavam não aconteceu. Ao menos em parte, isso se deveu à adoção de políticas econômicas consistentes com as expectativas dos investidores globais.
Na última rodada de ataques especulativos na Ásia, é importante registrar que a desconfiança foi crescendo na medida em que os governos da região culpavam Soros ou o FMI pelos problemas. O castigo veio a galope.
Nada impede que, nas próximas semanas, cada país volte a aparecer como o que de fato é, não como um gato pardo na noite da crise "asiática". Aqueles que conseguirem levar adiante políticas minimamente consistentes de ajuste no sistema bancário, desinflação imobiliária e reforma fiscal poderão voltar às graças dos investidores globais mais rápido do que se imaginava na semana passada.
No Japão, as empresas do setor automobilístico estão reprogramando suas encomendas e trazendo autopeças da Tailândia. Engana-se quem acredita que o resgate regional depende apenas de o governo japonês ter dinheiro ou de seus bancos comprarem os ativos em liquidação na Tailândia. O futuro dessas economias começa pela sua rede de fábricas preparadas para a exportação.
Melhor do que declarar a falência asiática é perceber que o ajuste cambial na maioria dos países da região já ocorreu. As reformas financeiras, políticas e fiscais levarão anos, como em qualquer lugar do planeta. Mas sob os escombros da especulação financeira há uma base produtiva integrada e de última geração.
A preocupação maior, nas próximas semanas, continuará voltada para as economias onde a reestruturação produtiva mal começou e o câmbio, as contas públicas e as contas externas estão desajustadas. Há várias candidatas, não necessariamente na Ásia.

Texto Anterior: Bateção de carteira
Próximo Texto: Os 30 de Birigui
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.