São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Jiang vai aos EUA para 'desarmar espíritos'

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

O presidente chinês, Jiang Zemin, vai aos EUA com uma missão primordial: cortejar a opinião pública norte-americana e desarmar espíritos contra ele e seus país.
O próprio roteiro de sua visita de oito dias, a partir de hoje, mostra que tudo foi feito com tal objetivo.
A primeira parada em território continental norte-americano (a entrada de Jiang nos EUA será em Honolulu, no Havaí) é Williamsburg, cidade histórica no Estado de Virgínia, 160 km ao sul de Washington.
Depois, Jiang segue para Filadélfia, símbolo da independência dos EUA. Nesses dois locais, vai exibir seus conhecimentos de história norte-americana e sua admiração, aparentemente sincera, pelos ideais libertários que embasaram a fundação do país que visita.
Dizem que ele sabe de cor o discurso de Gettysburg, feito por Abraham Lincoln no meio da Guerra Civil e um dos principais emblemas cívicos dos EUA.
Mas a parte do discurso que Jiang prefere citar é aquela em que Lincoln justifica o uso de violência para preservar a unidade nacional.
Direitos humanos
Jiang fala inglês, gosta das canções da Broadway dos anos 40 e é fã de Mark Twain, o grande escritor norte-americano do século 19, autor de "Tom Sawyer" e "As Aventuras de Huckleberry Finn".
Mas o presidente chinês, o primeiro a vir aos EUA em 12 anos, sabe que todo o seu conhecimento de história dos EUA e o charme pessoal que lhe é atribuído serão, sozinhos, insuficientes para garantir o sucesso de sua missão.
Bill Clinton, que não é de ter antipatias pessoais, deixou claríssimo após sua primeira reunião com Jiang, em 1993, em Seattle, Costa Oeste dos EUA, que o colega chinês não está na sua lista de amigos.
É verdade que Clinton, recém-empossado na Presidência e ainda constrangido por seus discursos de campanha (em que acusava George Bush, seu predecessor e adversário eleitoral, de ser mole com os chineses), jogou pesado demais ao cobrar respeito aos direitos humanos de Jiang, que respondeu com sua altivez típica.
Desta vez, já escolado, Clinton não deve ultrapassar as fronteiras da cortesia. Como, aliás, demonstrou na sexta-feira em discurso transmitido para a China pela TV.
Nele, o presidente dos EUA disse que seu país e a China têm de trabalhar juntos e conviver apesar das diferenças que os separam.
Isso não significa que Clinton vá deixar de abordar a questão dos direitos humanos em suas conversas com Jiang. Dezenas de manifestações de rua o estarão lembrando sempre que, para a opinião pública norte-americana, esse é o assunto que mais interessa na relação sino-norte-americana.
Dissidentes
Clinton está tentando fazer com que a China liberte alguns dos mais importantes dissidentes do regime liderado por Jiang antes de sua chegada a Washington, na terça-feira. Embora a possibilidade ainda exista, é considerada remota pela maioria dos observadores.
O que Jiang está trazendo de concreto como demonstração de boa vontade é a suspensão da cooperação nuclear entre a China e o Irã, um dos pontos cruciais para os EUA na sua relação com os chineses. Os EUA definem o Irã como Estado terrorista que não pode ter acesso a tecnologia nuclear.
Jiang também chega sem reivindicações em relação a Taiwan. Sua posição atual em relação à ilha, que se proclama país independente e a China considera parte de seu território, é deixar o tempo passar e ampliar contatos entre autoridades dos dois Estados.
O que Clinton mais deseja obter de Jiang é abertura para os produtos norte-americanos no mercado chinês.
No ano passado, a China teve superávit comercial de US$ 40 bilhões com os EUA. Em 1997, essa cifra pode chegar a US$ 50 bilhões.
Além disso, Clinton e Jiang vão discutir a Convenção do Clima e outros temas ambientais e cooperação no combate ao narcotráfico.
Após Washington, Jiang visitará Nova York, a Universidade de Harvard em Cambridge, Massachusetts, e Los Angeles, Califórnia.

Texto Anterior: Internet espalha boato global
Próximo Texto: China substitui URSS no duelo das potências
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.