São Paulo, domingo, 26 de outubro de 1997
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Modelo econômico não reduz exclusão

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

Até o "efeito tequila", a Argentina era um desmentido à crítica frequente contra o modelo econômico neoliberal, segundo a qual ele produz forte concentração de renda e aumenta a exclusão social.
Entre a posse de Menem, em 89, e 94, o ano em que o México explodiu e espalhou estragos por toda a América Latina, apenas os 20% mais ricos da população argentina viram sua fatia no bolo total encolher.
Tinham, em 89, 56,3% da renda nacional. Ficaram com 50,2%.
Melhoraram todos os outros segmentos, inclusive os 20% mais pobres, que viram sua renda subir de 3,8% para 4,8% do total.
A crise de 95 mudou tudo. A recessão atingiu com mais força, como quase sempre ocorre, quem menos pode se defender.
Resultado, contabilizado no "Informe de Conjuntura Trabalhista" publicado pelo Ministério do Trabalho, relativo a agosto passado: entre 90 e 96, os 60% mais pobres tiveram uma redução da renda de 6,1%.
Já os 10% mais ricos ganharam 3,5%. A classe média (os 30% restantes) melhorou um pouco menos -1,6%.
Mas seria injusto atribuir o drama social apenas ao modelo. Ramón Frediani, economista da Universidade Nacional de Córdoba, lembra, em estudo de 95, que "a principal causa geradora da pobreza na Argentina, nos últimos 20 anos, foi a inflação alta".
A média, no período 75/90, antes portanto do plano de estabilização, foi de devastadores 350% anuais.
Nesse período, 3 milhões de argentinos foram se juntar aos 4,5 milhões que já estavam abaixo da linha de pobreza, totalizando 21% da população. São os que não têm renda para pagar uma cesta de bens e serviços básicos de custo mínimo.
Mais pobres
O problema é que, a partir da crise de 95, mesmo sem inflação, o país continuou a criar pobres em quantidades industriais.
Se, em 91, 21% dos argentinos eram pobres, no ano passado a porcentagem já saltara para 27,9%, pelas contas de Susana Torrado, socióloga da Universidade de Buenos Aires.
Os indigentes (aqueles cuja renda não paga sequer os custos de alimentação) passaram de 2,4% a 5,5% no mesmo período.
São números tão contundentes que provocaram crítica até de uma economista (Silvia Montoya) da Fundação Mediterrânea, criada pelo ex-ministro Domingo Cavallo, responsável pelo plano de estabilização: "A realidade argentina desmente a teoria de que a pobreza se soluciona com crescimento. Desde 91, houve um crescimento importante, mas isso não se traduziu em emprego, nem em menos pobreza ou melhor distribuição."
Salários em queda
Héctor Valle, da Fundação de Investigações para o Desenvolvimento, acha que essa situação "veio para ficar". Explica:
"A tendência é de crescimento da economia e queda dos salários. Ademais, é preciso somar o problema do desemprego, que acentua essa disparidade."
Os economistas do governo não parecem convencidos.
Rodolfo Frigeri, por exemplo, presidente do Banco da Província de Buenos Aires, diz que, entre maio de 96 e maio último, foram criados 517 mil novos empregos. Ele prevê que a taxa de desemprego (16%) cairá a um dígito no ano 2000. O presidente Menem, aliás, também diz que, no ano 2000, o desemprego estará em 7%.
"Com um crescimento normal de 5%, ganharemos a batalha", aposta Frigeri. A Argentina cresceu 8% no primeiro semestre.

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