São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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Morgan afirma que o Brasil está sob o risco de se tornar a "bola da vez"

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

O banco norte-americano de investimentos Morgan Stanley diz, com todas as letras, que o Brasil está sob o risco de se tornar a "bola da vez" para os especuladores globais.
Em inglês, a expressão não é exatamente essa, mas quer dizer a mesma coisa: "Como uma montanha não escalada, o Brasil está 'ali', como alvo de oportunidade para especuladores globais", diz o relatório divulgado ontem e assinado por Ernest Brown, economista sênior para a América Latina.
Brown não deixa margem a dúvidas, até no título do relatório: "Brasil: em risco máximo nas presentes condições do mercado".
Parte do risco, avalia o Morgan, "se origina em uma história de reformas tardias e déficits gêmeos maiores do que o confortável" (alusão ao déficit fiscal e ao das contas externas).
Mas a outra parte do risco se deve ao fator "bola da vez", em tradução livre para o português do inglês "montanha não escalada".
O relatório calcula que a moeda brasileira está sobrevalorizada em 9% e diz que a desvalorização não passa de 4% ao ano, em termos reais (descontada a inflação).
O Morgan admite que essa diferença não chega a ser tentadora para os especuladores, mas afirma que estes "nunca se preocuparam muito com a paridade cambial" quando desfecharam seus ataques contra uma moeda.
Um ataque à moeda brasileira terá ou não sucesso? Resposta cautelosa do relatório: "Depende de quão coordenado for".
Perda de reservas
O relatório do Morgan acaba se revelando conservador no cálculo de quanto o Banco Central teria perdido de reservas na operação para defender o câmbio.
Diz que as vendas de dólar, na terça-feira, ficaram entre US$ 1,5 bilhão e US$ 2 bilhões, conforme uma fonte não identificada de São Paulo, mais a venda de pouco menos de R$ 1 bilhão em bônus indexados ao câmbio.
Cita, é verdade, outras "fontes de mercado", igualmente não identificadas, que apontam vendas ainda maiores.
Conclui que, como parte dos bônus foi vendida por dólares a investidores atraídos pelo alto retorno (9,8% anualizados para papéis de 70 dias), a redução das reservas "pode ter sido menor".
O Morgan calcula que a decisão sobre desvalorizar ou não o real passou às mãos do presidente.
Nesse ponto, faz uma aposta política numa bem-sucedida defesa da moeda. "Sem exceção (acreditamos), as moedas latinas têm sido desvalorizadas somente quando os líderes políticos são percebidos como fracos ou com profundos problemas políticos."
Arremata: "Cardoso não é uma coisa nem outra".
O relatório observa, ainda, que o presidente "ganharia pouco" se optasse pela desvalorização. Mas, de todo modo, afirma que, se as reservas forem substancialmente drenadas, ele pode decidir pela desvalorização.
Privatizações
O relatório é também pessimista em relação ao efeito da instabilidade nos mercados sobre as privatizações.
"O status do ambicioso programa brasileiro de privatização para 1998 é igualmente questionável, se o mercado de ações continuar a sofrer erosão", diz Ernest Brown.
Por fim, uma última nota pessimista: com ou sem desvalorização da moeda, "o custo para o Brasil do serviço de sua dívida interna será mais alto e o crescimento econômico também vai sofrer".
O Morgan prevê, agora, crescimento de apenas 3% para 1998 e suspeita que pode ser até um pouquinho menor se "a presente situação continuar até 98".
O paradoxal é que um relatório de segunda-feira do mesmo banco, mas de outra área, era muito mais otimista.
"Quando há uma grande venda em andamento, faz sentido preparar uma lista de compras (de ações) para aproveitar a melhor qualidade ao melhor preço", dizem Robert Pelosky Jr. e Hernando Cortina, da área de estratégia latino-americana.
"Não somos"
O secretário de Política Econômica da Fazenda, José Roberto Mendonça de Barros, faz um afago em Ernest Brown, o economista do Morgan ("admito que é um bom economista"), antes de contestar sua análise.
"Não vejo a gente como a 'bola da vez' de jeito nenhum".
O secretário reconhece que, de fato, há riscos, por estar o país no meio do processo de estabilização.
Acrescenta: "Não minimizo os riscos, mas acredito que não são maiores quantitativa ou qualitativamente do que os vividos em momentos anteriores".
Menciona, em especial, a introdução da URV (Unidade de Referência de Valores), uma espécie de moeda que antecedeu o real.
Mendonça de Barros conta que, na semana passada, conversou com muita gente em Nova York, inclusive com Ernest Brown, e não se sentiu parte de uma equipe cujo país poderia ser a "bola da vez".

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