São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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Banda é uma antena parabólica brasileira

MARCELO RUBENS PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Samba é o som do Brasil? Em termos. Samba é muito do Rio. Como frevo é de Olinda, maracatu é de Recife, carimbó é do Pará, axé music é da Bahia etc.
No Brasil, uma profusão de ritmos e sotaques massageiam nossos ouvidos e nos fazem estalar os dedos. Não tem um só som. Múltiplo o Brasil é. Mas qual é o som de São Paulo, o mais rico e mais populoso estado?
São Paulo é o que a grana faz. Tempera o moderno com o que vem do Brasil primitivo. São Paulo é Carlos Gomes, Paulo Vanzolini, Adoniran Barbosa. É Arrigo Barnabé, Ira!, Titãs.
É urbana, rica, caótica. É internacional, importa, compra, manda trazer. Foi punk, é tecno, foi disco, é clubber. Se renova.
Paulista tem "auto-ironia". Sabe que é cafona, ri de seu jeito estabanado, cultua o sotaque "moquês", tá ligado? O humor está em todas as esquinas. Humor em Rita Lee, Premê, Joelho de Porco, tantos outros.
São Paulo tem, agora, uma nova parabólica. Karnak é o som brasileiro de São Paulo. Karnak é humor, é história em quadrinhos, é praça da Sé e Liberdade, canta em português, árabe, catalão, italiano, russo e japonês.
As letras de André Abujamra são simples, inteligentes, simpáticas. "O umbigo do universo é o nosso umbigo... eu era convencido, agora não sou não, porque cheguei à perfeição", começa a letra da música que dá título ao disco, "Universo Umbigo". "Eu era pobre, andava de chinelo, hoje sou rico ando de Pajero", diz "O Mundo Muda".
Abujamra brinca com as palavras, com as línguas. Em "Candelara", depois de uma introdução de um Darth Vader sertanejo, tipo cabra da peste, ele canta: "Imaginavam que o homem era Deus, imaginavam wrong."
A música que mais resume as intenções da poética de Abujamra, música de trabalho do disco, é a que mais sucesso faz em seus shows, "Eu Tô Voando". "Nesse exato momento eu tô voando... Daqui do céu da pra ver tudo, os continentes desse mundo...", diz sua letra.
Abujamra olha de fora o absurdo das coisas simples, o Brasil de ricos e pobres, de gente triste e feliz. Seus pés estão na Terra. Mas seus olhos estão voando. Ele ironiza as rimas, como: "que será que o velho pensa no metrô, o que será que o nenê pensa no 'berçô'...".
Os ritmos se sobrepõem. De repente, um inacreditável arranjo de metais de Tiquinho atropela uma viola caipira. "Universo Umbigo" é um disco para ouvir, não apenas escutar.
(MRP)

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