São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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QUEM MATOU EM CARUARU

Pelo menos 64 pacientes do Instituto de Doenças Renais (IDR), clínica privada de Caruaru, morreram em 96 intoxicados quando tentavam purificar seu sangue em aparelhos de hemodiálise. Ninguém foi punido. As famílias dos mortos não foram indenizadas. Por ora, recebem pensão de um salário mínimo por mês.
Agora, o Conselho Regional de Medicina de Pernambuco acaba de decidir que não dispõe de provas para condenar os diretores do IDR.
Não se conhecem os motivos da decisão -a reunião foi secreta. Sejam lá quais forem, e antes que se complete mais um ciclo de impunidade, seria conveniente relembrar como 64 pessoas chegaram a uma clínica médica com rins doentes e saíram de lá com fígados envenenados, morrendo depois de hepatite tóxica.
A água que o IDR utilizava saía de um açude por meio de um carro-pipa, passava pelo reservatório da clínica, pelas máquinas de hemodiálise e entrava no corpo dos doentes. Diretamente. Não era tratada nem analisada. Em alguns dias de fevereiro de 1996, ocorreu que na água do açude apareceram algas azuis, que produzem toxinas. No caminho do açude até o corpo dos doentes renais, os venenos não encontraram, como de hábito, filtros ou outras barreiras. Chegaram aos pacientes e os mataram. Segundo o advogado dos diretores da clínica de Caruaru, que alegam inocência, o morticínio deveu-se a um "acidente ecológico".
O ministro da Saúde na época da mortandade, Adib Jatene, assumiu a parcela de culpa do ministério, que não fiscalizava as clínicas. Fica parecendo que o ministério e a natureza, que causou a proliferação de algas, são os únicos culpados. Ainda não foi atribuída culpa alguma aos médicos do IDR, que não estavam interessados em saber se injetavam veneno nos doentes, ao governo estadual, que não tinha um conselho fiscalizador, ou à Companhia Pernambucana de Saneamento e sua água suja.
Espera-se que a Justiça, que tarda em decidir, também não venha a ter sua culpa -a de aumentar a lista de impunidades criminosas no país.

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