São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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AS QUEIXAS CONTRA A PM

Tornou-se hábito entre as autoridades responsáveis pela segurança pública de São Paulo explicar cada atrocidade cometida pela polícia recorrendo ao clichê de que se tratou "apenas de um caso isolado". Um caso isolado que se repete frequentemente, seria preciso dizer. A ironia não é no entanto a melhor maneira de lidar com os desmandos de uma PM que comete maus tratos, abusa da autoridade, tortura e mata.
Confrontada com os números divulgados ontem no relatório da Ouvidoria da Polícia de São Paulo, contendo as reclamações da população referentes ao trimestre compreendido entre julho e setembro, a retórica do caso isolado se revela oca.
Pelo segundo trimestre consecutivo, as queixas contra abuso de autoridade dos policiais lideram as estatísticas. Foram, nos últimos três meses, 145 casos, de um total de 894 reclamações. Somando-se esse item aos protestos contra homicídios cometidos por policiais (19), espancamentos e torturas (43) e ameaças (28), chega-se a 235 ocorrências (26% do total) que constituem extrapolações mais ou menos violentas do poder que esses servidores públicos detêm e que ameaçam diretamente os direitos da cidadania.
É muito provável, como reconhece o próprio ouvidor, que a disposição de denunciar comportamentos truculentos da polícia tenha sido impulsionada pela exibição das cenas de tortura e assassinato na favela Naval, em Diadema. A reação da população é sem dúvida um bom sintoma, mas não deve encobrir o principal: apesar da repercussão do episódio, policiais, ou parte deles, continuam desrespeitando normas elementares de conduta civilizada e agem não como servidores públicos, mas como se fossem membros de uma milícia privada, contra a qual a aplicação da lei e as punições são hipóteses remotas.
A PM está sob novo comando desde o final de setembro. O próximo relatório do ouvidor será um termômetro para medir eventuais alterações nesse quadro.

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