São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Metade do lucro de TVs em sorteios vai para clubes

Entidades filantrópicas recebem apenas 5% do valor total

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

A indústria de sorteios de prêmios pela TV, criada em dezembro do ano passado, a propósito de arrecadar fundos para instituições filantrópicas, está sendo usada para melhorar as finanças dos grandes clubes brasileiros de futebol.
O contrato de direito de transmissão dos jogos do Campeonato Brasileiro, assinado pela Globo em maio último, garante que o Clube dos 13 -entidade que congrega os principais times do país- receberá metade do lucro gerado pelos sorteios, em nome de filantrópicas, realizados pela emissora.
A Rede Bandeirantes assinou contrato nos mesmos termos, mas seus sorteios estão baseados na Lei Zico. As duas emissoras já pagaram US$ 3 milhões -US$ 1,5 milhão cada uma- aos clubes de futebol, como adiantamento da receita das premiações.
No final do ano passado, o Ministério da Justiça baixou a portaria 729, permitindo que cada instituição filantrópica faça um sorteio anual de um bem que tenha recebido em doação. A portaria também permitiu que as apostas fossem feitas pelo telefone (pelas linhas 0900, de âmbito nacional) e que os sorteios fossem divulgados pelas TVs.
A partir daí, empresas especializadas no 0900 e as emissoras de televisão montaram uma indústria de premiações, na qual as filantrópicas são as que menos ganham.
Até o final de agosto, o ministério autorizou cerca de 400 sorteios, veiculados pela Globo, SBT, Manchete, Record e CNT. Segundo a Telebrás, até aquela data, foram arrecadados R$ 119,6 milhões em ligações telefônicas, dos quais apenas 5% foram repassados às filantrópicas.
A Globo foi a última a aderir ao esquema dos sorteios, mas deu nova escala à jogatina. Ela estreou com um sorteio de carros durante a transmissão da luta de boxe entre Mike Tyson e Evander Holyfield (29 de junho), que bateu o recorde de ligações (2,789 milhões). Desde então, tem feito duas promoções semanais vinculadas ao futebol.
Cada sorteio da Globo tem registrado, em média, 350 mil ligações telefônicas. A ligação custa R$ 3. Até 13 de setembro, foram 5,96 milhões de ligações, que deram uma receita bruta de R$ 17,8 milhões.
Significa que, dos R$ 17,8 milhões gerados até agora pelos sorteios vinculados ao futebol na Globo, R$ 2,68 milhões ficarão com a Embratel e apenas R$ 759,9 mil com as filantrópicas.
O contrato entre o Clube dos 13 e a Globo -que vale não só para o campeonato deste ano, mas também para os de 98 e 99- diz que os clubes têm direito a 50% da receita líquida das premiações.
A Folha apurou que está havendo um desentendimento entre a Globo e a direção do Clube dos 13 por causa dessa cláusula.
Os clubes entendem que têm direito à metade da receita líquida total dos sorteios. A Globo, por sua vez, diz que eles só têm direito à metade da receita líquida que ela recebe. A diferença entre um entendimento e outro envolve milhões de reais.
O diretor de marketing do Clube dos 13, Jaime Prado, que também é diretor do São Paulo Futebol Clube, confirmou que a entidade está questionando a prestação de contas inicial apresentada pela Globo.
O diretor jurídico da emissora, Marcelo Pinto, afirma que seria ilegal repassar metade da receita líquida total dos sorteios para os clubes de futebol. "Isso fere frontalmente a portaria do Ministério da Justiça, que diz que a receita líquida dos sorteios pertence às entidades filantrópicas. A Globo não é dona dos sorteios", diz ele.
Esse não é o entendimento, por exemplo, do presidente do Flamengo, Kleber Leite, que participa do Clube dos 13. Por telefone, ele disse à Folha que o contrato é claro ao estipular os 50% sobre a receita líquida total do sorteio.

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