São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Crash global faz cotações dos títulos da dívida externa recuarem até 17%

FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os títulos da dívida externa brasileira, um dos principais indicadores da confiabilidade do país no exterior, estão cotados com preços de aproximadamente um ano e meio atrás.
Não adiantaram os esforços do governo, aumentando a taxa de juros para garantir a proteção da moeda. Os investidores que se arriscam a ter bônus brasileiros venderam muitos papéis. Na sexta-feira os preços eram menores do que os do início da semana, quando teve início o crash global das Bolsas.
Todos os papéis brasileiros fecharam o mês de outubro acumulando grandes perdas, quase todas acima de 10%.
Isso aconteceu também com os outros dois países que rivalizam com o Brasil em termos econômicos, como México e Argentina.
Só que no caso do México e da Argentina, as perdas foram mais suaves.
Todos os títulos mexicanos ainda acumulam valorização ao longo deste ano. Os argentinos estão mais ou menos divididos: há perdas grandes (até 15% de desvalorização) e ganhos razoáveis (7,5% de valorização).
As perdas dos papéis brasileiros são uma demonstração de que o país ficou mais vulnerável do que México e Argentina nesta crise. Dos 11 papéis mais comercializados da dívida brasileira, 9 tiveram desvalorizações acima de 10% no mês de outubro.
Mesmo um título festejado, o C-bond, perdeu 17,51% de seu valor em outubro.
O campeão das perdas foi exatamente um papel que nasceu durante o governo FHC, e que deveria ser mais imune a dúvidas sobre sua solidez.
Trata-se do título conhecido no mercado como Rep-27, lançado pelo presidente do Banco Central, Gustavo Franco. Esse papel começou outubro sendo vendido com ágio (US$ 100,35 para cada US$ 100) e terminou na sexta-feira sendo ofertado a US$ 81 -uma perda de 19,28%- e com poucas pessoas interessadas em gastar dinheiro para adquiri-lo.
Mercado de risco
Esses papéis do Brasil eram considerados muito ruins até o início desta década. O país era tido como caloteiro no mercado internacional. Pedia dinheiro emprestado. Dava um título em troca. Mas não pagava em dia suas obrigações.
Isso começou a ser resolvido com a renegociação da dívida externa. Novos títulos foram emitidos e os antigos aposentados. O Brasil passou a pagar em dia.
México e Argentina renegociaram suas dívidas antes de o Brasil se acertar com os banqueiros. Nesse mercado, como de resto em qualquer outro, o histórico de bom pagador é que constrói a reputação de um país.
Por isso, por terem se arrumado antes, Argentina e México são mais considerados pelo mercado -que é de alto risco.
Como pagam juros altos, esses títulos da dívida são bons investimentos quando os países honram seus compromissos.
No caso de dúvida sobre a capacidade de pagamento, o preço desses papéis cai no mercado secundário. Quase todos são vendidos com deságio. Isto é, alguém pode comprar um título cujo valor de face é US$ 100 por apenas US$ 70.
Os investidores ganham dinheiro de três formas com papéis de dívida externa: 1) com o deságio no preço; 2) com a eventual desvalorização no mercado secundário e 3) com a alta rentabilidade desses bônus em relação aos mesmos instrumentos (em termos de prazo de vencimento e juros) emitidos pelo Tesouro dos Estados Unidos.
Momento de comprar
Para os investidores, parte da perda de valor dos títulos deverá ser amenizada nos próximos dias.
Essa é a opinião do chefe do Departamento de Mercados Emergentes da Salomon Brothers, Desmond Lachman, que falou à Folha por telefone, de Nova York, por telefone na sexta-feira à noite.
A Salomon é uma das corretoras mais ativas do mundo nesse mercado de títulos de dívida. "Não tem sentido os papéis terem recuado, num determinado momento, para os níveis de preço de 95", diz.
"Os fundamentos econômicos não sofreram alterações para sustentar uma queda dessa magnitude. O governo brasileiro também foi rápido em tomar as providências necessárias e acho que agora é esperar", afirma Lachman.
Para ele, foi muito relevante que o Banco Central tenha deixado claro que pretende defender a moeda brasileira de ataques especulativos que possam existir.
"Mais do que isso, foi importante saber que o governo tem demonstrado interesse em fazer mais reformas que levem a um controle ainda maior da economia".
Também para Alvaro Simões, diretor do Banco Indosuez, os títulos brasileiros podem retomar os patamares de antes da crise.
Segundo Simões, que foi o principal operador da negociação da dívida externa brasileira pelo Citibank, a recuperação vai depender de como responderem os agentes financeiros em outros países.

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