São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Turbulência na Bolsa faz o coração de operador bater em ritmo de Fórmula 1

SUZANA BARELLI

SUZANA BARELLI; LUIZ CINTRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Unicór acompanha frequência cardíaca de corretor, que vai a 178 quando a Bolsa desaba 9,81%

Quinta-feira, 30 de outubro, 18 horas. O coração de Abel Bianco Duarte, 36, dispara e chega a 178 batidas por minuto. Não, ele não é um piloto de Fórmula 1, como indica o eletrocardiograma.
Abel Duarte é, na verdade, um operador de pregão da Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), com as desvantagens de não ter o preparo físico nem a alimentação saudável dos campeões de corrida. E, além de tudo, é fumante.
Mas não foi apenas no fechamento do pregão -quando a Bolsa caía 9,81%- que o coração de Duarte disparou.
Na abertura da Bovespa, às 12h, seu coração dava 162 batidas por minuto (bpm) -um recorde já que a média dos trabalhadores registra menos de cem bpm durante o horário do expediente.
Às 13h30, quando o "holter" (aparelho que monitora a frequência) soltou do seu peito, o operador estava completamente suado e a Bolsa caia 4,03%. (O aparelho foi recolocado em seguida).
No decorrer do pregão -com a Bolsa em queda e Duarte operando Telebrás (a ação mais negociada)- a média da frequência cardíaca foi de 108 bpm.
"É uma frequência muito alta e indica um perfil com grande probabilidade de ter doenças cardiovasculares", diz o médico cardiologista Fábio Baptista, da Unicór.
Não é para menos. O mercado de ações vive a terceira pior crise de sua história. E a perda acumulada de patrimônio das empresas na Bovespa chega a vários bilhões de reais. Haja coração para enfrentar tamanha tensão.
Monitor
A unidade de cardiologia da Unicór acompanhou para a Folha obatimento cardíaco do operador. Duarte ficou 6 horas e 46 minutos com o "holter". No período, seu coração deu 33.318 batidas.
Duarte aceitou o convite da Folha de monitorar seu coração durante o pregão por um único objetivo: "Estou preocupado com a minha saúde e quero saber como me cuidar melhor."
O aparelho -uma série de fios e um pequeno gravador preso da cintura- incomodou um pouco durante o trabalho. "A gente se movimenta muito no pregão e há muita aglomeração", diz.
Com o resultado do exame, Duarte não planeja mudar de profissão nem deixar para trás seus 20 anos de pregão. "Adoro a minha profissão. Não vou parar", diz o operador que começou a trabalhar na Bolsa com 16 anos.
A idéia de Duarte é tornar sua vida mais saudável e fazer check-up periódicos. Atualmente, ele faz exercícios físicos, como esteira e bicicleta, "de vez em quando".
O médico Baptista recomenda para Duarte caminhadas diárias de pelo menos 30 minutos. E alerta: os efeitos positivos só aparecerão a longo prazo.
A alimentação do operador ainda está atrapalhada com a mudança de horário da Bovespa. Na quinta-feira, ele tomou um bom café da manhã e, antes da abertura do pregão, bebeu um suco de abacaxi. Nas seis horas em que passou negociando ações, ele não comeu. "Prefiro não entrar no pregão de estômago cheio."
Doenças profissionais
A única regularidade de Duarte é o exercício de relaxamento das cordas vocais, que faz diariamente em casa.
Na sua carreira de operador, ele já precisou ser operado para tirar um pólipo da garganta e ficou sem voz diversas vezes. "Fiz até um tratamento para aprender a falar direito e não perder a voz."

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