São Paulo, segunda-feira, 3 de novembro de 1997
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Não deu para esperar

VALDO CRUZ

A semana começa com a equipe do ministro Pedro Malan (Fazenda) passando o seguinte recado: é preciso acelerar as reformas previdenciária, administrativa e tributária para que o real fique imune a ataques especulativos como os sofridos nos últimos dias.
Acelerar, como bem define o dicionário Aurélio, significa fazer algo andar mais rápido. No caso das reformas, algo que está entravado no Congresso há muito tempo, desde o início do governo FHC.
A reforma previdenciária foi encaminhada ao Legislativo em março de 1995. A administrativa e a tributária, em agosto do mesmo ano. Essa última foi abandonada no meio do caminho, de tão ruim que era. Uma reforma tributária digna do nome foi enviada apenas neste ano.
Quando as propostas foram encaminhadas ao Congresso, no distante ano de 1995, o discurso da equipe econômica não era nem um pouquinho diferente do de agora. Malan e seus assessores diziam que a sobrevivência do Real dependia daquelas propostas.
Como as reformas não caminharam, o presidente FHC veio a público dizer exatamente o contrário: o real não sucumbiria se as reformas não fossem aprovadas. Em conversas reservadas, FHC chegou a dizer que a sua equipe tinha errado ao propalar que a sobrevivência do real dependia das reformas constitucionais.
Na verdade, o governo tucano não quis trombar com seus aliados no Congresso. Sabia da fragilidade do real, mas nunca fez um esforço real pela aprovação das reformas administrativa, previdenciária e tributária.
Enquanto isso, o desempenho do governo no controle das contas públicas era desanimador. Primeiro, o déficit público disparou, ficando acima dos 7% do PIB (Produto Interno Bruto, a medida das riquezas produzidas no país).
Depois da explosão, a equipe econômica, é bom reconhecer, começou a trabalhar, conseguindo reduzir o déficit para 5% do PIB.
Uma marca, no entanto, ainda muito alta. Elevada o suficiente para transmitir um clima de insegurança aos investidores estrangeiros sobre a capacidade do governo brasileiro de arrumar a sua casa.
Tivesse o governo feito o dever de casa, o país poderia estar hoje na mesma situação de países como o Chile, que não entraram em pânico com o crash global da semana passada.
É como diz o próprio ministro Pedro Malan, ao analisar a decisão de dobrar a taxa de juros para conter a fúria dos especuladores: às vezes dá para esperar passar as eleições, às vezes não dá.
Pelo visto, o presidente FHC, pressionado por seus aliados, estava aguardando passarem as eleições. Fazia, na verdade, uma aposta: era possível esperar as eleições e fazer o ajuste depois. Não deu.
Agora, o que se deseja do governo FHC é que se empenhe realmente pela aprovação de reformas consideradas tão importantes. Não apenas ficar dizendo que é preciso votar. Que tal despender esforço semelhante ao que foi usado para aprovar a reeleição? Só que agora em nome do país.

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