São Paulo, quarta-feira, 5 de novembro de 1997
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Exemplo de civilização

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Com tanta e tamanha confusão nas Bolsas, deu-se que acordei preocupado com a Inglaterra, com a sua Casa Real precisamente. Nada a ver com o caso de Lady Di, mas com um episódio bem mais antigo. Não sei precisar o ano, mas houve certa manhã que abalou o Reino e muito me abalou pessoalmente.
Deu-se que a guarda do Palácio Real encontrou um desconhecido na alcova da Rainha. E havia manchas de sangue na cama. Feitas as perícias e averiguações, descobriu-se que se tratava de um louco cuja fixação era exatamente frequentar o Palácio Real em horas indevidas. Como conseguia passar pela segurança não foi devidamente explicado. Era um cidadão decente, casado, com filhos, saíra de casa dizendo que ia comprar cigarros.
Em todo o mundo há gente que faz isso diariamente, sai de casa para isso ou aquilo e não incomoda a Rainha da Inglaterra nem dá trabalho a Scotland Yard. Logo, muita razão tem aquela divisa da Ordem da Jarreteira, "honny soit qui mal y pense" -seja maldito aquele que pensa mal.
Quanto ao sangue no lençol, a explicação foi simples: o sujeito fumara um cigarro, deixara o cinzeiro cair, ao catar os cacos ferira o fura-bolo, não tendo lenço na ocasião e não querendo despertar a Rainha, limpara o fura-bolo no lençol real.
Bem, um troço desses na Sicília, mesmo que fosse com a mulher ou a filha de um pastor de cabras, daria um bode desgraçado. Na Inglaterra, a polícia prontamente apurou a verdade e o príncipe consorte aproveitou para falar mal do palácio. Já pedira verbas especiais ao Parlamento, quando acordava com sede tinha de atravessar quilômetros de corredores para chegar à copa.
Certa noite, cambaleando de sono, entrara numa porta errada e dera um susto desgraçado numa das camareiras que ali dormia. Em face disso, o Parlamento autorizou a compra de um moderno frigobar para ser instalado na alcova dos soberanos. Civilização é isso.

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