São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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Vigário põe caixa de coleta de seringa na igreja

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

O paulista Domiciano José Ribeiro Siqueira, 39, era paisagista e usuário de drogas pesadas até alguns anos atrás. Hoje coordena o programa de troca de seringas da Prefeitura de Porto Alegre, o mais ousado e bem sucedido do país.
Em 14 meses de trabalho, a equipe de dez "redutores" -como são chamados os que atuam no programa- já se espalhou por seis "áreas" de uso e tráfico de drogas. Cerca de 120 dependentes mantêm contato frequente com as equipes. No mês passado, 2.000 seringas foram trocadas. O número parece grande, mas acredita-se que menos de 15% dos que usam drogas injetáveis tenham sido atingidos.
O desafio da equipe gaúcha foi ganhar a confiança de usuários e traficantes. Alguns deles se tornaram "agentes espontâneos", recolhendo as seringas usadas. Segundo Siqueira, os traficantes entendem a importância do trabalho e concordam com a entrada da equipe em áreas "proibidas". Agentes chegam a ser aceitos em "rodas de pico", quando os usuários se reúnem para injetar a droga.
Vinte e duas caixas coletoras de seringas usadas foram instaladas nas áreas, algumas delas na casa dos "agentes espontâneos". Um deles adaptou um tubo de PVC através da parede de sua casa, de forma que os usuários podem jogar ali a seringa usada, a qualquer hora.
O vigário de uma região de muito uso de drogas se cansou de todas as manhãs recolher as seringas sujas que eram depositadas nos vazios das paredes de tijolos da igreja. Siqueira convenceu-o a instalar uma caixa coletora dentro da igreja e hoje os dependentes entram só para deixar a seringa.
"Se você quer entrar na rede, tem que estar presente, estar do lado deles", diz Siqueira. Três madrugadas por semana, ele passa percorrendo ruas da periferia. Fora de hora, pode ser chamado por um bip que os usuários conhecem. "Se está faltando seringas ou alguém se envolve em problemas, eles me chamam", diz.
Antes de iniciar o programa -que é financiado pelo Ministério da Saúde-, prefeitura e agentes fizeram várias reuniões com representantes do Ministério Público, do Judiciário e da Polícia Civil. "A polícia conhece os agentes e não cria problemas." (AB)

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