São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 1997
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FMI, o próximo passo?

CELSO PINTO

Dois dias depois do anúncio de um dos maiores pacotes fiscais da história do Brasil, o mercado já especulava, ontem, sobre o passo seguinte na defesa do câmbio: um possível acordo com o FMI. Por aí se vê o tamanho do nervosismo do mercado, materializado na queda de 10,2% na Bolsa de São Paulo.
O problema não é que o mercado considere o pacote fiscal pequeno, ou sujeito a um drástico encolhimento ao passar pelo crivo político. O fato é que o ajuste brasileiro veio tarde, num momento de alta instabilidade internacional e depois de o país passar a ser visto como um dos mais vulneráveis entre os maiores emergentes.
Existe, também, um problema de "timing". Quanto mais forte for o efeito recessivo do pacote, mais rápido melhorarão os resultados externos. Ainda assim, isso só deverá acontecer no primeiro trimestre do próximo ano. Já há quem projete superávit na balança comercial para o mês de março de 98. O desafio é chegar vivo até lá.
Considerando as perdas de dólares na última semana de outubro e neste mês, até terça-feira, elas já superam US$ 9 bilhões. Como antes, em outubro, o resultado vinha sendo positivo e, dado o critério de contabilização do Banco Central, a perda de reservas no mês passado pode ficar na casa dos US$ 5,5 bilhões. O fato é que a sangria diminuiu, mas não parou.
Algumas medidas estimulam o ingresso de dólares de curto prazo, mas seu impacto será sentido ao longo do tempo. Um banco influente prevê que o Brasil vai fechar este ano com reservas em torno de US$ 50 bilhões, ou seja, com uma perda de US$ 12 bilhões em relação a setembro. Ainda é um volume significativo, mas uma perda desse tamanho seria muito desconfortável.
O que fazer? Até agora, o governo seguiu, passo a passo, o roteiro de crises externas. Começou vendendo dólares, nos mercados spot e futuro, títulos cambiais, jogou os juros na Lua e fez um pacote fiscal. O passo lógico seguinte seria assinar um acordo com o FMI, não só para reforçar o caixa, mas principalmente para melhorar a credibilidade.
No mercado, ontem, circulavam três boatos: 1) que o presidente argentino, Carlos Menem, teria aconselhado nosso presidente a fazer um acordo rapidamente; 2) que um acordo com o FMI já estaria pronto; 3) que o Fundo pediria uma desvalorização de 15%. Dos três, o menos crível é o terceiro, cuja origem é uma instituição financeira em Nova York que, ao que tudo indica, teria a ganhar com a confusão que provocou.
Existem, de todo modo, alguns fatos. Uma missão rotineira do Fundo acabou de voltar do Brasil, esperando um pacote fiscal em torno de 1% do PIB. O pacote acabou superando 2% do PIB, o que impressionou muito bem o FMI.
Outro fato: o que o Brasil já fez, até agora, facilitaria muito um acordo com o Fundo. O aumento dos juros, o pacote fiscal, a privatização e o ajuste no sistema bancário são ingredientes que o Fundo exigiria e que o país já fez. É provável que o FMI pedisse ainda mais empenho fiscal, mas não seria uma guinada em relação ao que está sendo feito.
Também é claro que o governo só irá ao FMI se não tiver alternativas. Acordos com o Fundo são sinônimo de desgaste político no Brasil. Além disso, o Brasil foi o único grande país que fechou acordo com os bancos credores e fez a estabilização sem o FMI. Não porque não quisesse, mas porque o FMI não quis apoiar. Isso criou ressentimentos fortes em Brasília.
É uma corrida contra o tempo, e parte do jogo está fora do Brasil. Um banqueiro em Nova York diz que a Coréia tem US$ 25 bilhões em reservas e US$ 50 bilhões em compromissos com prazo inferior a um ano. A cotação de sua moeda no mercado a termo está 22% superior à cotação oficial. Muita gente considera iminente o colapso coreano e acha que o Brasil ficará ainda mais vulnerável se ele ocorrer. Outros acham que a quebra da Coréia já está, em grande medida, descontada no mercado.
Outro grande temor é a Rússia. Até porque vários bancos brasileiros compraram muitos papéis russos nos últimos meses.
Quer dizer, mesmo fazendo o que o mercado gostaria, o Brasil não saiu da linha de tiro.
Quanto ao impacto do pacote fiscal, o economista chefe do Unibanco, Tomás Málaga, fez uma avaliação mais cuidadosa. Até o fim do primeiro semestre de 98, ele ajudaria com R$ 12 bilhões. Ao mesmo tempo, no entanto, o custo extra dos juros na Lua seria de R$ 14,5 bilhões, e o impacto recessivo reduziria em R$ 2 bilhões as receitas fiscais. Conclusão: apesar do pacote, o déficit iria piorar em R$ 4,5 bilhões, de hoje até o final de junho de 98, pelos custos dos juros mais altos e da recessão.
Málaga elogia o pacote fiscal. O fato, contudo, é que, em oito meses, ele não pagará nem sequer o aumento dos juros. O que dá uma idéia do custo extraordinário embutido na defesa do câmbio.

Emaill: CelPinto@uol.com.br

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