São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 1997
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Censura e liberdade

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Durante a última Bienal do Livro, aqui no Rio, um dos líderes da comunidade judaica conseguiu liminar para apreender obras de propaganda nazista. O juiz que concedeu a medida estava solidamente apoiado na lei que considera o racismo (e sua propaganda) um crime.
A editora acusada defendeu-se invocando o artigo 5º, inciso 9, da Constituição Federal: "É livre a expressão da atividade intelectual, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença".
Mais recentemente, tivemos o caso de um conjunto musical preso por fazer propaganda da maconha. Também há uma lei, bem antiga por sinal, proibindo tal propaganda. O juiz que, no meu entender, desastradamente mandou prender os rapazes, estava apoiado em preceito legal. Não cometeu nenhuma barbaridade jurídica ou moral, mas valorizou a luta dos rapazes pelo direito de fumar maconha em paz.
O cipoal de leis que nos rege cria diariamente esse tipo de armadilha. Ficamos subordinados à opção de um juiz que aplica ou não um dispositivo legal negado em outro. Certo que a Constituição deve prevalecer, mas os dispositivos da chamada Lei Magna são, em essência, vagos e não raras vezes contraditórios.
O caso dos livros, por exemplo, se enquadra dentro da "atividade intelectual", assim como a música dos rapazes, tecnicamente, pode ser considerada uma "atividade artística". Por conseguinte, ambos independem de consulta ou licença.
Semana passada, em Porto Alegre, durante a 43ª Feira do Livro, passei pela barraca que vendia livros de propaganda nazista. Estava às moscas. Mas os organizadores da mostra não tiveram motivos para discriminar o que, no meu entender, é perversa comunicação intelectual.
Estudei em seminário, onde metade dos livros produzidos pela humanidade eram proibidos. Não digo que li todos eles, mas o bastante para, certo ou errado, ter uma opinião que algumas vezes me levou à cadeia.

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