São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 1997
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Muita alegria por nada

ANTONIO DELFIM NETTO

Causou grande "frénésie" em alguns círculos a última declaração do sr. Alan Greenspan, o presidente do FED. Segundo certas interpretações, ele teria condenado a desvalorização cambial como solução para os problemas de economias em dificuldades. E não faltou quem visse nas suas palavras uma aprovação à política cambial do governo brasileiro. O entusiasmo chegou quase ao delírio quando ele afirmou que "elas (as desvalorizações) podem criar no curto prazo algumas vantagens competitivas, mas, muito rapidamente, elas serão pulverizadas pela inflação".
Alan Greenspan é um profissional altamente cuidadoso e sua mensagem é clara: a simultaneidade da informação aumenta o risco de contágio e a percepção (correta ou não) dos agentes econômicos quanto às vulnerabilidades de um país, pode forçá-lo a despejar suas reservas "diante das irresistíveis pressões sobre suas taxas de câmbio".
A lição de Greenspan não tem nada a ver com o Brasil. Quando o câmbio está sobrevalorizado (que é o caso do Brasil) e é controlado pelo mercado financeiro (isto é, por enormes diferenciais de taxas de juros) e a sua sustentação exige uma restrição permanente da taxa de crescimento da economia, o único caminho é a flutuação do câmbio nominal. Foi assim que fizeram a Inglaterra, a Itália, a Suécia, a Espanha, Portugal e a Finlândia em 1992. Não há nada mais falso do que afirmar que "as vantagens competitivas foram pulverizadas pela inflação", uma vez que em todos esses países a inflação continuou caindo... Greenspan não estava se referindo a esse tipo de desvalorização que restabelece o câmbio real de equilíbrio interno e externo. Ele se referia à desvalorização "competitiva" (entre os asiáticos) que tenta manter o câmbio real subvalorizado e que termina, inevitavelmente, em mais inflação. Certamente esse não é o caso do Brasil.
Quando há livre flutuação cambial, a taxa de câmbio real é uma variável endógena, a taxa de juros interna tende à internacional e o crescimento da economia não sofre o constrangimento imposto pela restrição externa. Como é possível pensar em taxa de câmbio real em equilíbrio, com juros internos cinco vezes maiores do que os externos e taxas de crescimento do PIB iguais à metade do possível?
O gráfico abaixo mostra a taxa de câmbio nominal dos Estados Unidos (março de 1973 = 100) desde que o dólar passou a flutuar livremente.
Como vemos, o dólar valorizou-se dramaticamente na primeira metade da década de 80 e depois desvalorizou-se na mesma intensidade na segunda metade. O que aconteceu com a taxa de inflação americana? Caiu continuamente! Logo, não é verdade que os movimentos de mercado na direção do câmbio real de equilíbrio produzem inflação. E é claro que Greenspan nunca teve a intenção de dizer isso.

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