São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 1997
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Um novo projeto de governo

CELSO PINTO

A vitória do governo na reforma administrativa ajuda a dar fôlego ao Brasil a curto prazo, mas é bom não se iludir. Para reconstruir a credibilidade no mercado internacional de forma duradoura, será preciso muito mais.
Como diz uma fonte próxima ao presidente, "não se trata apenas de aprovar as reformas administrativa e previdenciária, é preciso reorganizar o projeto do governo". Nos três anos de governo FHC e quatro desde o anúncio do Plano Real, fez-se pouco na área fiscal e menos ainda em favor da ampla reorganização do Estado e do próprio governo.
Um diagnóstico que se tem consolidado em círculos próximos ao presidente, ao que tudo indica compartilhado por ele, é que o governo precisaria mudar radicalmente a sinalização. A reação à crise, até agora, foi emergencial e costurada às pressas. Falta indicar uma direção de longo prazo.
O que existe, por enquanto, é "sacrifício sem horizonte". Não ajuda a reeleição nem é suficiente para convencer o mercado internacional a médio prazo.
Um passo na direção desejada pode estar embutido no novo projeto de reforma da Previdência, que está sendo costurado por um grupo de economistas, dentro e fora do governo, comandados por André Lara Resende. É um projeto amplo e que toca em pontos cruciais para o horizonte de médio prazo: ajuda a fechar uma conta aberta crescente do setor público nos próximos anos e a elevar a poupança interna. De duas formas: reduzindo o déficit público e ampliando o papel do sistema de previdência privada.
O projeto já teve uma primeira rodada de discussão interna, semana passada, com quatro ministros -Pedro Malan, Antonio Kandir, Clóvis Carvalho e Paulo Renato- e foi bem recebido. Não está fechado, mas a idéia é anunciá-lo até o final do ano.
Outro ponto que alguns conselheiros do presidente consideram importante seria uma reestruturação do ministério, a partir do próximo ano. Não basta o governo levantar novas idéias e bandeiras. É preciso que convença o público interno e externo de que será capaz de implementá-las de forma muito mais eficaz e coordenada do que fez nos últimos três anos.
Em outros termos, o governo não terá tempo para parar a administração um ano e cuidar de sua reeleição. Terá que ajustar a rota, redobrar o cacife das reformas, mudar a máquina e sair jogando.
Tudo isso, é claro, é mais fácil falar do que fazer. Quais são os riscos de não fazer?
O Brasil corre dois riscos, um a curto prazo, outro em seis a oito meses. O primeiro é derivado da crise internacional. O Brasil ficou mais vulnerável, em função de seus déficits interno e externo, e o mercado convenceu-se de que a relativa rigidez do câmbio colocou o país no grupo de alto risco. Existem, de fato, diferenças substantivas de condições econômicas e de ciclo econômico entre Brasil e Ásia, mas, a curto prazo, o que prevalece no mercado é a percepção geral das fraquezas brasileiras.
Como o Brasil deverá continuar perdendo reservas nos próximos meses, um novo susto a curto prazo no mercado internacional poderia ser perigoso. Se o país fizer a travessia até o ponto em que vão melhorar as contas externas, graças a um saldo comercial gerado pela forte retração econômica no início de 98, ainda assim estará sujeito ao risco de novas instabilidades, em meados do próximo ano.
Por três razões: 1) superávits comerciais gerados por retração econômica não garantem sustentação a médio prazo, como mostrou a experiência de 95. A menos que as exportações tenham, até lá, dado provas definitivas de vitalidade, será inevitável o mercado voltar a discutir sobre o futuro da política cambial no novo governo;
2) depois de quatro ou cinco meses de juros altos, o sistema financeiro e a economia estarão mais frágeis. Voltar a usar a defesa de juros altos para enfrentar novas instabilidades, portanto, terá menos credibilidade;
3) a retração econômica do primeiro trimestre deve provocar estragos na candidatura FHC e gerar, no mínimo, mais incertezas no cenário político.
Para evitar riscos desse tipo, não bastarão promessas, como as feitas nos últimos quatro anos. Será preciso convencer o público interno e externo de que mudou a qualidade do projeto do governo. Esse é o desafio.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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