São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 1997
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Johannesburgo questiona noções de nacionalidade

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

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O curador Okwui Enwezor justifica em entrevista à Folha sua opção por discutir questões políticas e sociais na 2ª bienal da Johannesburgo, na África do Sul.
Folha - Em seu discurso sobre "Trade Routes", o título da bienal, você fala de diferenças sexuais, identidade, etnicidade, movimentos de massas, globalização. Você não acha que existe uma contradição em uma bienal que se divide em seções que catalogam arte por sexo, como na mostra "Life's Little Necessities", apenas com artistas mulheres, ou por nacionalidade, como em "Graft", que apresenta artistas da África do Sul?
Okwui Enwezor - Aparentemente pode haver alguma contradição. Comecemos pela mostra "Graft", de artistas sul-africanos.
O papel nacional dos artistas sul-africanos hoje foi descontextualizado como parte de um processo de globalização.
A questão não é apenas de nacionalidade, mas problematizar essas questões mais amplas, que atingem níveis políticos e sociais. Não se trata de contradição, mas de uma maneira de rever a maneira como pensamos a nacionalidade.
Na mostra de obras de mulheres, convém lembrar que quando tratamos de questões como globalização, cidadania e movimentos de massa devemos analisar questões de poder e, nesse discurso, as mulheres sempre se posicionaram.
No início, eu não concordei com a idéia de produzir uma mostra apenas com obras de mulheres, mas meu discurso é sobre contestação e debate e a curadora teve oportunidade de apresentar uma mostra sobre mulheres enquanto categoria política em um acirrado jogo de poder.
Folha - Conceitos como desterritorialização, ausência de fronteiras e imigração são relevantes na discussão da arte hoje?
Enwezor - Eu não acho que estamos tratando da erradicação das fronteiras. Isso seria um ideal utópico. O que tentamos fazer é exacerbá-las. Quando falamos de imigração, tratamos de algo muito específico. Falamos que o movimento nas fronteiras são frequentemente produtos de situações violentas, como em Ruanda ou de refugiados em Paris.
Lidamos com mecanismos de força e proibição, que restringem esses movimentos, da maneira como as pessoas são catalogadas como estrangeiros, aliens, trabalhadores ilegais e outras categorias.
A bienal não está restrita à arte nacional, mas trata de questões estéticas. As questões artísticas se relacionam com questões políticas, relações sociais, tradições culturais e contestações econômicas.
Folha - Quantos países participam do evento?
Enwezor - Temos 64 países, mas não estamos pensando em participações nacionais e sim em artistas. A bienal de Johannesburgo questiona o conceito de pavilhões nacionais, que acontece nas bienais de São Paulo e Veneza. Nós temos interesse em olhar para a arte baseados em questões mais críticas que a simples questão da nacionalidade.
(CF)

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