São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 1997
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Livro reúne clássicos da cozinha italiana

NINA HORTA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Afinal de contas, quem é essa Marcella Hazan, lendária "mamma" italiana? Sejamos tão objetivos quanto ela mesma é. Marcella escreveu os melhores livros de cozinha italiana da atualidade.
Outros bons autores podem inspirar o novato, mas Marcella simplesmente segura a nossa mão e ensina o passo a passo de comer e cozinhar. Com ela, todos podem ir ao fogão e botar a mão na massa.
Há 20 anos, Hazan escreveu o seu primeiro livro, "The Classic Italian Cooking", seguido por "More Classic Italian Cooking".
Fez um sucesso enorme, nos Estados Unidos, onde morava com o marido, Victor, e o filho Giuliano, mas continuou sua vida de sempre, de dona-de-casa e professora de culinária, cozinhando para a família e os alunos.
Os pratos dos dois primeiros livros foram evoluindo, ou melhor, Marcella foi apurando as receitas tanto na prática quanto na redução. Resolveu, então, juntar os dois livros num só -transformando-os no "Essentials of Classic Italian Cooking", reescrevendo, peneirando e aumentando.
É esse o livro que a editora Martins Fontes publica agora, com o nome de "Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica".
Marcella tem hoje 73 anos, é casada com o mesmo marido de sempre, Victor Hazan. Tudo começou quando, recém-casados, ele sentiu saudade da comida da "mamma". Marcella era bióloga, professora de matemática e perfeccionista e resolveu aprender a cozinhar para o marido.
E deu no que deu. Livros nos quais você acredita piamente, feitos com o cuidado de teses respeitáveis.
Quem escreve sobre comida sabe dos problemas de receitas claras e infalíveis. Falta de espaço. E Marcella Hazan, teimosa e dona de seu nariz, tem receitas de uma simplicidade única, mas que se estendem, às vezes, por seis páginas fluentes e fáceis de ler.
Prevê os nossos erros, avisa das possibilidades de fracasso, ensina a estrutura do prato que se está fazendo. O resultado, por incrível que pareça, é não precisar mais da receita, porque o aprendiz entendeu a alma do negócio.
Se alguém pegar esse livro de quase 700 páginas e resolver executá-lo de cabo a rabo, torna-se um chef ou pelo menos uma "mamma" ou "bappo" afiadíssimo nos segredos das massas, dos risotos, das polentas...
Marcella, na sua simplicidade, acabou por educar bastante o paladar norte-americano, falando da Itália inteira e não só do sul e introduzindo novos ingredientes.
Pimentões amarelos, rúcula, vinagre balsâmico, radicchio, tudo isso se transformou em moda, coisa que a deixa de mau humor, pois batalha justamente por uma cozinha sem modismos.
Para preparar os livros, trabalhou como antropóloga de campo. Saiu atrás, pôs o pé na estrada. Tem o maior orgulho da diversidade de seu país, desde as costas cheias de peixe -que considera dádivas de Deus a uma população pobre- às pequenas Shangrilas interioranas.
Dá uma importância enorme ao assunto. Compara a cozinha italiana com qualquer outra arte do país, como a escultura, arquitetura e pintura, com a única diferença de que se come a obra terminada.
Enxerga em Bolonha a arte barroca na explosão incessante de texturas e sabores. Compara um T-Bone de Florença a um tema essencial e sem adorno. Na Sicília, vê pratos que começam como idéias simples e severas e acabam como catedrais barrocas.
Sofreu muito nas suas peregrinações atrás de receitas passadas de mãe para filhos. "Nós, italianos, não sabemos dar receitas. Digamos que alguém vai explicar um ensopado de cordeiro. Começa com o 'battuto' (temperos picadinhos), passa para o 'sofrito', (temperos refogados), conta uma história do neto que está estudando fora... E o cordeiro, ingrediente principal? Nada do cordeiro. Esquece o cordeiro."
O marido de Marcella, que foi se transformando num conhecido enólogo, tem um papel importante neste casamento também de profissões. Não se importa de ficar na sombra, mas sem a sombra dele Marcella não teria possibilidade de desenvolver o seu trabalho.
Ela cozinha, ele experimenta. Os dois avaliam. Ela escreve em italiano, ele traduz para um inglês perfeito, mantendo o estilo da mulher. Ela é espontânea, pés no chão, malcriada. Ele é um publicitário, bom conhecedor da língua, intelectual e comedido.
O ensinamento básico de Marcella é o seguinte: há duas coisas que você não pode deixar de fazer. Dormir e comer. Fazer amor é importante, mas pode-se viver sem isso. Comer é vital. Por que não fazer direito?

Livro: Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica
Autora: Marcella Hazan
Lançamento: Martins Fontes
Quanto: 37,50

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