São Paulo, sexta-feira, 28 de novembro de 1997
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Wim Wenders apresenta seu thriller meditativo

LN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

"Defina violência. Você está fazendo um filme sobre isso, devia saber o que é." A voz "over" que fala a um produtor de cinema, logo no início de "The End of Violence", equivale à assinatura de Wim Wenders neste que é mais um de seus filmes típicos. Como de costume, um filme dentro de um filme, o conceito tomando o lugar do concreto, a preocupação moral se infiltrando na gênese do cinema.
Wenders continua o mesmo. Mas, felizmente, está conseguindo limpar seu cinema meditativo e metalinguístico da filosofia ingênua e da melancolia romântica que o levavam a uma lamentação cansativa sobre o mundo e o cinema atuais. Em "The End of Violence", sua reflexão sobre a situação o leva, ao contrário, à composição de um thriller envolvente, no qual a história não é menos importante que o jogo virtuosístico com os gêneros hollywoodianos.
O resultado é tão fascinante quanto foi "Paris, Texas" em seu tempo, embora a parceria com Nicholas Klein, autor do argumento de "The End of Violence", se revele mais contida que a temática dilacerada de Sam Shepard, que escreveu a história do outro filme americano de Wenders. A começar pela fotografia, dessa vez a cargo de Pascal Rabaud, cuja gélida perfeição consegue ser a tradução acabada do terror.
Um exemplo, já na brilhante abertura do filme: o megaprodutor de cinema Mike Max (Bill Pullman) trabalha à beira da piscina de sua mansão hollywoodiana, construída no topo de um rochedo sobre o mar.
Tudo é calmo, limpo, lindo. Bem ao estilo de Wenders, o produtor se comunica com o mundo por meio de vários telefones e computadores, todos confortavelmente instalados ao redor de sua cadeira, que se ergue e se vira automaticamente, conforme a necessidade.
Quanto maior a ênfase sobre o conforto do personagem, maior o desconforto do espectador. O vazio, a solidão asséptica que cercam o produtor afinal se evidenciam quando um dentre os telefones toca e é sua esposa (Andie MacDowell), a apenas alguns metros dali, isolada pela vidraça da sala. Está conformada a cadeia wendersiana da incomunicabilidade, que só será quebrada pela violência.
São espécies de "golpes de realidade" que fazem cada personagem revelar sua face cruel ou simplesmente humana. A "stunt-girl" revela seu amadorismo como atriz, após ferir-se num filme. Depois de sequestrado por ladrões de automóveis, o milionário Mike Max resolve mudar de identidade e viver como jardineiro entre os hispânicos de Los Angeles. Desaparecido o marido, a mulher outrora ingênua se envolve com os mafiosos do cinema. E todos, afinal, se unem enquanto peças de um jogo do FBI.
Em sua volta aos Estados Unidos, depois de um longo período europeu, Wenders se mostra afinado com o que de melhor se vem produzindo no cinema americano. A comparação com David Lynch é inevitável, diante de um Bill Pullman cujo personagem duplo foi tão marcante no recente "Estrada Perdida". Mais que tudo, Wenders está mais irônico e bem humorado, esquecido, ao que parece, da angústia do fim do cinema e, simplesmente, filmando melhor.

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