São Paulo, segunda-feira, 8 de dezembro de 1997
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EUA perdem com reunião

ROBERT FISK
DO "THE INDEPENDENT", EM TEERÃ

A recusa israelense de aceitar o Estado palestino está trazendo até mesmo árabes "amigos" de Washington para a reunião islâmica na capital do principal adversário dos EUA no Oriente Médio.
Pode haver símbolo maior do fracasso norte-americano? Na fria cidade de Teerã, varrida pelo vento que vem das montanhas, os chamados "parceiros da paz" estarão confraternizando com os inimigos de Washington no mundo árabe.
Na cidade que as revistas norte-americanas gostam de chamar de "a capital do terrorismo mundial", bandeiras da Jordânia, do Egito e da Autoridade Nacional Palestina -que fizeram acordos de paz com Israel- tremulam ao lado das do Iraque, da Síria e de diversas outras nações árabes.
Iasser Arafat estará presente, o homem que, há sete anos, trocou cumprimentos com Yitzhak Rabin na Casa Branca.
Também estará presente, acreditam os iranianos, o rei Hussein, da Jordânia, cuja fúria pela tentativa de Israel de assassinar um líder do grupo extremista islâmico Hamas em sua capital, Amã, ainda não foi aplacada.
Amr Moussa, o ministro das Relações Exteriores do Egito, estará em Teerã -e esforços estão sendo feitos para persuadir o próprio presidente Hosni Mubarak a comparecer. O príncipe Abdullah já deu sinais de que representará a Arábia Saudita. Taha Yassin Ramadan, o primeiro-ministro do Iraque -o país que invadiu o Kuait há sete anos e ameaçou os sauditas- representará o presidente Saddam Hussein.
É uma conferência islâmica, não uma reunião árabe. Nações muçulmanas do Sudeste da Ásia estarão participando, assim como o Paquistão, a Bósnia e a Turquia. O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, foi convidado.
Muitos dos delegados chegarão a Teerã ansiosos para ver se o presidente Mohamed Khatami está de fato libertando sua sociedade das amarras do Irã pós-revolucionário, como afirmam seus simpatizantes.
Os assuntos que serão discutidos na conferência, como os direitos da mulher, a educação e a crise no Oriente Médio, são menos importantes do que o momento em que ela acontece: exatamente quando quase todas as nações árabes já perderam as esperanças no chamado "processo de paz".
Os iranianos têm muito a agradecer ao primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu. O anúncio recente de que mais habitações judaicas serão construídas em territórios árabes ocupados só dá razão aos que sempre sustentaram que o processo de paz não passa de uma armadilha dos EUA para transformar os árabes em suplicantes de Israel.
O que a cúpula de Teerã salientará é o fracasso dos EUA em persuadir seus "amigos árabes" a compartilhar da cúpula econômica árabe-israelense no Qatar, no mês passado. Agora, todos os que estiveram ausentes aceitam vir ao país que os EUA continuam tentando isolar.
O Irã sempre advogou -e isso foi proclamado com animosidade crescente pelo já morto aiatolá Khomeini- que os árabes que assinavam a paz com Israel, acreditando na neutralidade de Washington como garantia do cumprimento dos acordos, acabariam traídos.
Agora, sem nenhuma ajuda do Irã, Netanyahu prova para diversos países árabes aquilo que o regime iraniano vem dizendo há tempos.
Os temores de uma revolta iraniana no mundo árabe, de novas disputas territoriais na região do golfo Pérsico ou as alegações de que o Irã estaria por trás da violência "islâmica" no Oriente Médio são, no momento, menos importantes do que a recusa dos Estados Unidos de exigir que Israel assuma seus compromissos e faça valer o que está escrito nos acordos de paz.

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