São Paulo, sexta-feira, 19 de dezembro de 1997
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A carência e a ação

LUIZ CAVERSAN

Rio de Janeiro - As pesquisas e contatos realizados para a concepção do caderno especial sobre solidariedade, que a Folha entrega hoje aos leitores, propiciou a aproximação com conceitos e situações bastante interessantes, todos ligados ao ato de um ser humano ajudar outro menos favorecido.
Chamou a atenção não só a diversidade de maneiras que o cidadão verdadeiramente empenhado em agir encontra para exercer sua solidariedade, mas principalmente o que está por trás dessas demonstrações de humanismo.
O que leva um a ajudar o outro? Por que as iniciativas de trabalho voluntário são tão incipientes no Brasil? Por que, comparativamente ao volume da população e às carências sociais do país, há tão poucas entidades ditas de utilidade pública, agindo para ocupar um espaço que o Estado é incapaz de fazê-lo?
Certamente não há respostas únicas para cada uma dessas questões, mas pode-se intuir algumas conclusões.
Uma delas, bem original, dá conta de que o ato voluntário seria, por mais contraditório que pareça, uma decorrência do individualismo. O indivíduo que não acredita nas instituições, no Estado, no ser humano em geral, assumiria para si a tarefa de "fazer o que tem de ser feito". É uma idéia.
A outra diz respeito à desarticulação dos movimentos populares após a implantação do regime militar, em 64. Para reprimir sua eventual atuação política, os militares acabaram com centenas de entidades civis, agremiações, grupos de trabalho, sindicatos etc. que, se tinham de fato alguma ação político-partidária, exerciam importante atividade assistencial junto a populações desfavorecidas.
Note-se que a proliferação de ONGs é concomitante ao processo de redemocratização do país.
Seja como for, a questão da solidariedade é uma imposição inevitável.
Movida pela culpa, individualismo ou verdadeiro amor ao próximo, encontra seus caminhos no fértil terreno das necessidades desse país de carências.

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