São Paulo, sábado, 20 de dezembro de 1997 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Direito à honra
ANTONIO MAFFEZOLI LEITE Uma das matérias mais polêmicas em discussão no Congresso é o projeto da nova Lei de Imprensa.Obviamente, os órgãos de comunicação têm dado grande destaque aos efeitos supostamente nocivos que ele trará se aprovado. Comentam que poderá ser inviabilizado o funcionamento de pequenas empresas com a não-limitação das indenizações, o que acabaria gerando uma prática de autocensura. Ora, se é certo que o direito à informação e à livre manifestação do pensamento é um dos pilares do Estado democrático de Direito, um dos direitos humanos mais fundamentais é o direito à privacidade e à intimidade. Embora a honra e a imagem pessoal sejam protegidas pela Constituição, que assegura, inclusive, direito à indenização caso sejam violadas, sabemos todos que mais justo do que indenizar é prevenir. Senão, qualquer pessoa com capacidade econômica poderia promover a ofensa que bem entendesse contra outra, bastando pagar algum valor pecuniário depois. É como se um homem pudesse livrar-se da prisão pagando à vítima de um estupro que cometera. Seria o reconhecimento oficial de que ricos jamais vão para a cadeia. Longe de defender a pena de prisão, propomos que, no projeto da nova lei, se impeça a lesão à honra e à intimidade de alguém. Os órgãos de imprensa são unânimes em criticar o caso da Escola Base como exemplo do que um mau jornalismo faz com um cidadão. Todos, na época, veicularam o caso e os nomes dos injustamente acusados. Hoje, criticam como se só os concorrentes tivessem violado normas do bom jornalismo. Mas reincidiram no chamado "caso Bodega" e reincidem no relato do caso da bomba num avião da TAM, expondo um professor à execração pública enquanto encontrava-se em estado de coma. Adianta ele provar sua inocência e, eventualmente, até receber indenização de todos os grandes jornais e revistas do Brasil que expuseram seu rosto nas capas? Logo, o mero estabelecimento de indenizações não restitui a justiça e a verdade, muito menos a honra e a imagem pública de um cidadão. Assim, é preciso tentar impedir que tais violações aconteçam. Por que não proibir que os órgãos de comunicação divulguem nomes e rostos de pessoas acusadas de crime? Não se violaria o direito constitucional da livre informação e se garantiriam os direitos constitucionais à intimidade, à honra e à presunção de inocência. Note-se: não se está propondo a não-veiculação do fato, a censura, mas apenas dos nomes e dos rostos dos supostamente envolvidos. Eles devem ser considerados inocentes até o final de um processo criminal, que poderá nem ser instaurado. A imprensa assim já procede em relação aos adolescentes. Assim, propomos incluir no projeto um dispositivo que proíba a veiculação dos nomes e dos rostos de acusados pela prática de um delito até o trânsito em julgado de decisão penal condenatória. Garantiríamos os direitos constitucionais à livre informação e manifestação do pensamento, mas também à intimidade, honra, imagem e presunção de inocência. Isso é, verdadeiramente, um Estado democrático de Direito. Antonio José Maffezoli Leite, 26, é procurador do Estado em São Paulo e membro do Grupo de Trabalho de Direitos Humanos da Procuradoria Geral do Estado. Texto Anterior: D. Pedro instituiu o júri no Brasil Próximo Texto: Judiciário: frente e perfil Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |