São Paulo, quarta-feira, 31 de dezembro de 1997
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Funk e o rap abalam o Brasil em livro

XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Acadêmicos narram como o funk e o rap abalaram o Brasil
A máquina de "samplear" reinventou a música no morro carioca. Explodia o funk no Rio. Rapidamente passou a ser associado, de maneira preconceituosa, a todas as formas de violência.
A memória fresca desse fato, parte importante da história da juventude suburbana do país, está no livro "Abalando os Anos 90 - Funk e Hip Hop, Globalização, Violência e Estilo Cultural".
A série de artigos para entender o caso foi organizada pelo professor Micael Herschmann, pesquisador do Núcleo de Estudos e Projetos em Comunicação da UFRJ (Universidade do Rio de Janeiro).
Embora esteja mais concentrado no fenômeno funk do Rio, casa da maioria dos autores, o livro situa o consistente movimento do rap paulista e faz uma embaixada também nos subterrâneos do South Bronx, onde negros e hispânicos arranharam os primeiros discos.
A coleção de textos começa com o antropólogo Hermano Viana, autor de "O Mundo Funk Carioca", que sai com bons achados sobre o modo como a mídia e a polícia viram a aurora "funkeira" na cidade do rio.
"As mesmas mídias que viam os funkeiros como demônios faziam de Xuxa a embaixatriz do funk", anota. Viana prossegue: "(...)não foi só a tecnologia armamentista que subiu o morro, mas também a tecnologia musical do sampler e da bateria eletrônica".
Caso de polícia, com imagem associada por jornais e emissoras de TV a todos as manifestações de violência no Rio, como os supostos arrastões, o funk, primo preto do samba, teve vida dura até se firmar na cidade e no país
Bem ilustrado, o livro tem uma série de letras de funk e rap, como clássicos dos Racionais MC's.
Em alguns momentos, os artigos despencam para o academicismo, o que é natural, devido à origem da maioria dos autores. Mas nada que estrague a leitura.
O professor George Yúdice, que ensina literatura latino-americana e estudos culturais na City University of New York, por exemplo, reestuda o mito da cordialidade e da "democracia racial" de que falava Gilberto Freyre.
"Por meio das músicas novas e nada tradicionais como o funk e o hip hop, os jovens procuram estabelecer novas formas de identidade desvinculadas das proclamadas premissas do Brasil como uma nação sem diversidades conflitantes", diz Yúdice.
A aventura na terra do DJ Malboro, onde os primeiros bailes funks vingaram ainda nos anos 70, continua com Herschmann.
Ele faz o fino da sociologia sobre o rap e o funk no país, com a percepção, pouco comum a acadêmicos quando estudam temas quentes e atuais, de entrar em detalhes como saber, por exemplo, a ponte do funk carioca com a base musical conhecida como Miami Bass.
Com os mesmos bons cuidados, seguem ainda textos decentes de Olívia M. Gomes da Cunha (uma conversa imaginária com Ice-T), Glória Diógenes, José M. Valenzuela Arce, Livio Sansone e Tricia Rose (um belo ensaio sobre política e o hip hop que veio do Bronx).

Livro: Abalando os Anos 90
Organização: Micael Herschmann
Lançamento: Rocco
Quanto: R$ 29 (220 págs.)

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