São Paulo, terça-feira, 4 de fevereiro de 1997 |
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'Companheiro' é representante nacional
AMIR LABAKI
Sinal de prestígio do "thriller" político de Barreto. Basta lembrar que ao fraco "A Terceira Margem do Rio", de Nélson Pereira dos Santos, o último concorrente brasileiro em Berlim, foi reservada uma projeção já no crepúsculo do festival de 1994. Mas não se espere demais de "O Que É Isso, Companheiro?". Mesmo ainda incompleta, a lista de concorrentes de Berlim-97 é das mais fortes. O papel externo da nova produção de Lucy e Luiz Carlos Barreto, depois de "O Quatrilho", já foi cumprido: devolve o cinema brasileiro a uma honrosa participação na competição de um dos três principais festivais de cinema. Boa forma "O Que É Isso, Companheiro?" confirma o que "Atos de Amor" (Carried Away, 1995) já indicava: Bruno Barreto voltou à boa forma como narrador cinematográfico. O resultado não tem o encanto de "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976) ou a contundência de "Romance de Empregada" (1987), mas também passa longe dos tropeços de "Assassinato sob Duas Bandeiras" (Show of Force, 1990), em gênero o título mais próximo a "Companheiro?" de sua filmografia. O filme de Barreto é uma versão concentrada, ágil e grave do depoimento geracional de Gabeira. A adaptação assinada pelo roteirista Leopoldo Serran restabelece a cronologia dos fatos e fixa-se no drama central do livro, a opção pela luta armada do jornalista sediado no Rio pós-golpe de 1964. O foco dramático é monopolizado pelo sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, visto como forma de propaganda contra o regime militar. Acompanha-se o treinamento dos jovens terroristas, a captura de Elbrick, a tensa convivência num sobrado, o cerco militar, a vitória com o cumprimento das exigências, a alegre dispersão e a queda que conduz à tortura, à morte ou ao exílio. Tudo se desenvolve com fluência e distanciamento. É impossível não lembrar de "Pra Frente, Brasil" (1983), de Roberto Faria, "Nunca Fomos tão Felizes" (1984), de Murilo Salles, e "O Bom Burguês" (1983), de Oswaldo Caldeira, obras que cumpriram no cinema função similar ao quase contemporâneo livro de Gabeira, contando para o Brasil em processo de redemocratização a saga da resistência à ditadura. Naturalismo da abertura "O Que É Isso, Companheiro?", o filme, é assim uma espécie de representante temporão daquilo que já foi chamado de "naturalismo da abertura". Bruno Barreto extrai o melhor de um elenco escolhido a dedo. Alan Arkin rouba o filme com sua minimalista composição de Elbrick. Pedro Cardoso e Luiz Fernando Guimarães, respectivamente nos papéis de Gabeira e de um terrorista bobo e violento, levam ao chão o estereótipo de cômicos. A carbonária Maria devolve nuances e calor à interpretação de Fernanda Torres. Marco Ricca, por fim, veste de credibilidade o mais polêmico dos personagens, um militar torturador dividido entre as dores da consciência e o que acredita ser o chamado do dever cívico. (AL) Texto Anterior: Impressões sobre 'Sertão das Memórias' Próximo Texto: Mantras e rock voltam a se encontrar Índice |
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