São Paulo, terça-feira, 18 de fevereiro de 1997
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"O Que É Isso, Companheiro?" estréia no festival de Berlim

PAULA DIEHL
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM BERLIM

"O Que É Isso, Companheiro?", filme de Bruno Barreto, foi apresentado no festival de cinema de Berlim no último domingo. O diretor levou um grande time à Alemanha: os produtores Lucy e Luís Carlos Barreto, a atriz Fernanda Torres, o escritor Fernando Gabeira e Valery Elbrick, filha do embaixador americano Charles Elbrick (que é personagem do filme).
"O Que É Isso, Companheiro?" é baseado no livro de mesmo nome do escritor e deputado Fernando Gabeira e conta a história de rapto do embaixador americano Charles Burke Elbrick pelo grupo terrorista de esquerda MR-8 em 1969.
Além de remeter o público ao clima da ditadura militar, o filme mostra de forma crítica a luta armada da esquerda brasileira.
Bruno Barreto diz que não acha que seu filme seja politicamente engajado, apesar de ser um filme político, e que não se trata de uma versão romantizada da resistência de esquerda.
Fernando Gabeira diz que acredita ter escrito "o primeiro livro sobre os vencidos".
Barreto afirma que não queria fazer um filme maniqueísta. "Eu nunca fui uma pessoa engajada politicamente. Eu sempre detestei todo esse discurso de esquerda e direita. Sempre achei isso uma bobagem, uma chatice. Mas eu sempre tive uma grande curiosidade pelo ser humano", diz.
"Eu procurei fugir do Costa-Gravas, nunca gostei dos filmes dele", acrescenta.
No entanto, muitos financiadores permaneceram céticos em relação à versão cinematográfica de "O Que É Isso, Companheiro?".
"Foi muito difícil achar investidores para o filme. Muitos dos investidores que já haviam financiado outros filmes que nós havíamos produzido não quiseram financiar este, pois diziam: 'Por que nós vamos financiar um filme pró-comunista, que faz os terroristas parecerem heróis?' ", conta Barreto.
O diretor surpreendeu o público do festival ao levar Fernando Gabeira, envolvido no sequestro do embaixador americano, junto com a própria filha do embaixador, Valery Elbrick.
Em entrevista exclusiva à Folha, ela falou sobre seu pai e os dias do sequestro que inspirou o filme. Leia trechos a seguir.
*
Folha - Qual foi a sensação de encontrar Fernando Gabeira, um dos membros do grupo que sequestrou seu pai?
Valery Elbrick - Incrível. Quando o meu pai estava sequestrado, eu pensei várias vezes sobre quem eram os terroristas, se iam matá-lo, se iam torturá-lo.
Imaginava a cara deles, os tipos. Na época eu não sabia nada da situação do Brasil, para mim os terroristas eram um gênero de criminosos.
Folha - Seu pai chegou a falar sobre Gabeira na sua casa?
Valery - Não em especial. Meu pai leu o livro do Gabeira e marcou nas páginas, "não era assim", ou "era assim" ou "absolutamente não". Ele disse que deu uma gravata de presente para o meu pai quando saiu da casa e não era assim. Todas as fotos do meu pai regressando à embaixada são sem gravata. Mas são coisas pequenas.
Folha - Seu pai chegou a comentar em casa a situação da política brasileira quando era embaixador? A opinião dele sobre a guerra do Vietnã que aparece no livro e no filme chegou a ser comentada?
Valery - Não, ele nunca falava dessas coisas. Não havia como ele se lembrar. Mas também se deve reconhecer que estava com uma pistola na cabeça. Então as coisas que disse... É difícil dizer.
Meu pai era muito conservador. Até o último momento de Nixon, quando ninguém acreditava mais, meu pai falava: "Não, eu acho que ele está falando a verdade" (risos). Então não acho que ele diria que o Vietnã era um erro. Mas não sei.
Folha - O que você achou da imagem de seu pai no filme?
Valery - Foi dado um caráter humanitário a meu pai que me foi surpreendente.

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