São Paulo, quarta-feira, 19 de fevereiro de 1997
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Vinte anos de fantasmas

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Aqui e ali, volta e meia aparecem na mídia referências à má vontade de alguns poucos jornalistas contra o presidente da República e seu grupo. No mesmo dia, em três colunas de diferentes jornais, havia referências a essa má vontade. Era dito e escrito que os descontentes acusavam FHC de querer ficar 20 anos no poder.
Quem falou nesses 20 anos de poder foi o ministro-sócio-melhor amigo. E falou ao mesmo tempo em tom de ameaça e de auto-satisfação. Nem adianta acusar Sérgio Motta de desastrado e boquirroto. Todos os movimentos políticos e administrativos do governo revelam a montagem de um dilatado esquema de poder.
Não se trata sequer da natural aspiração de um partido ao topo da sociedade por meio do governo. É uma aspiração apartidária, de classe e interesse. Todos serão bem-vindos à coligação que se arma para dar 20 anos de poder ao neoliberalismo. Cargos, verbas, agrados, tudo.
Verifica-se até um certo cinismo nessa distribuição de agrados: agora mesmo foi designado para uma representação no exterior um funcionário afastado do serviço por envolvimento com fornecedores de um programa de rastreamento do espaço aéreo -escândalo que motivou a demissão de um ministro que, sendo militar de carreira, não participava da armação política.
Todo esse movimento de cúpula, destinado a garantir o pacto social às avessas de que ontem falei, deverá ser aprovado, paradoxalmente, pelo processo eleitoral -e para isso o real terá de ser mantido a qualquer custo.
É o preço que o empresariado se obrigará a pagar para continuar como está. Bem verdade que todos reclamam da irrealidade do câmbio que prejudica exportações e eleva a taxa dos juros. A alternativa que o governo dá é: ou isso ou Lula (ou Vicentinho, ou Maluf ou outro qualquer fantasma criado "ad hoc"). Um esquema que pode durar mil anos -como um outro que foi para o lixo da história.

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