São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 1997
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Angústia com a euro-moeda

ÁLVARO ANTÔNIO ZINI JR.

Muitas dúvidas sobre os principais passos futuros da União Européia ficaram evidenciadas nesta última semana. Embora pouco noticiado no Brasil, há uma incerteza crescente no velho continente sobre sua estratégia para crescer, como integrar o Leste europeu e o que fazer de seu próprio projeto de uma Europa unificada.
Vamos ficar hoje com a discussão da moeda única européia, o euro. Pelo tratado assinado em Maastricht em 1990, a nova moeda deve começar a circular em janeiro de 1999, emitida por um Banco Central Europeu (retirando a primazia do BC alemão conduzir quase unilateralmente a política monetária do continente).
O Tratado de Maastricht impôs quatro critérios para um país participasse do lançamento do euro: déficit público de 3% do PIB; inflação não superior a 2,6%; dívida pública de 60% do PIB; e harmonização das políticas tributárias. Na prática, apenas os dois primeiros critérios serão impeditivos, mas em 1990 não se sabia que por volta de 1997 a Europa estaria sob pressões recessivas, o que faz crescer o desemprego e aumenta o déficit público.
No início da semana, a divulgação de uma taxa de desemprego recorde na Alemanha (acima de 12%), declarações à imprensa de Helmult Kohl, chanceler alemão, de que não está mais seguro do sucesso de Maastricht e incertezas se Kohl irá se recandidatar a chanceler em 1998 causaram grandes dúvidas se a Alemanha irá manter seu compromisso com a criação da euro-moeda.
Isto bastou para provocar uma forte onda especulativa com as moedas da Itália, Espanha e Portugal, pois sem o euro esses países veriam suas moedas enfraquecidas nos mercados internacionais como castigo por políticas fiscais "frouxas" no passado. "Vivemos hoje no tempo da 'democracia' financeira; a soberania está nas mãos dos mercados. Não é o melhor dos mundos possíveis, mas é com o qual devemos fazer as contas", disse acertadamente Paolo Savona, ex-diretor de pesquisa do Banco da Itália e diretor da Confindústria.
Kohl é o principal advogado da moeda européia na Alemanha, mas enfrenta a oposição de Edmund Stoiber, influente líder político da Bavária, e de Hans Tietmeyer, presidente do Banco Central alemão que não quer perder seu poder de influência por meio do marco.
Há três opções para a Alemanha: ir à frente com a euro-moeda, com a adesão da Itália, Espanha e Portugal, lançar a euro somente com a França e países do Benelux ou inviabilizar a nova moeda.
Qualquer dessas opções terá outras repercussões sobre o projeto político mais geral da Europa unificada. Para nós, é importante sublinhar como, no mundo globalizado, pequenas notícias podem causar fortes oscilações no câmbio, atentar que o projeto Europa-unida ainda sofrerá dificuldades expressivas e anotar que não há mais certeza de que a euro será mesmo lançada em 1999.

Álvaro A. Zini Jr., 44, é professor titular da Faculdade de Economia e Administração da USP.

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