São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 1997
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Indução à evasão

OSIRIS LOPES FILHO

O Brasil, se houvesse a instituição de um campeonato mundial da evasão fiscal, seria forte candidato ao título de campeão. Apesar da obsessão nacional pela primeira colocação em tudo, não há dúvida de que tal premiação seria desprimorosa.
A evasão tributária situa-se em torno de 50% da base tributária. Em termos simples, pode-se afirmar que, para cada real arrecadado, um outro devido deixa de sê-lo.
Em verdade, a evasão deve ser examinada num ponto de vista amplo. A evasão é numerosa e frequente quando a carga tributária (soma de todos os tributos) é elevada. Aliás, essa qualificação é elegante e não reflete a realidade. A carga, neste país, é indecente e pornográfica.
Essa pressão tributária aumentou brutalmente em 1996, graças às leis ordinárias, leis complementares e medidas provisórias editadas ao longo de 1996, pelo governo federal.
A CPMF é o emblema mais significativo da voracidade arrecadatória do governo, a elevar cada vez mais a carga tributária do país. Perdão, não do país, mas do contribuinte que já paga corretamente os tributos. Muita gente paga com exatidão o tributo, pois não tem como escapar. O caso típico é o do assalariado, que já tem descontado na fonte o IR devido. Esse não tem como evadir-se.
A partir de 1993, a carga tributária, que durante décadas girou entre 22% e 24% do PIB, começou a subir. Alcançou em 1995 pouco mais de 31%. Em 1996, vai-se repetir percentual semelhante. É uma brutal elevação ocorrida em curto período. Teria havido crescimento do total médio de tributos pagos pelos cidadãos brasileiros? Creio que não. Essa elevação deu-se em relação aos contribuintes leais e corretos. O evasor e principalmente o sonegador têm vida cada vez mais folgada.
A evasão provoca enorme distorção nos preços de mercado, afetando a lisura na concorrência. Quem tem hoje todas as condições de prosperar é a empresa evasora.
O instinto básico na vida, seja das pessoas, seja das empresas, é o da sobrevivência. Sobrevive-se sonegando. O nosso sistema é indutor da evasão. Doentio.
É de se lembrar: se todos pagarem o tributo devido, todos pagarão menos. É preciso inverter perverso o processo tributário manipulado pelo governo federal. Conceber-se uma redução de impostos, senão por virtude, a beneficiar o povo brasileiro, pelo menos por pragmatismo, para facilitar a reeleição presidencial. É isso aí.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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