São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Hidrelétricas favorecem reaparecimento de doenças

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A BELO HORIZONTE

As mais de cem hidrelétricas construídas nos rios que escorrem para a Bacia do Prata estão espalhando pelos países da região endemias que já estavam sob controle. Sem nenhum estudo sobre o impacto das obras sobre o homem, as usinas provocaram sérias mudanças no meio ambiente facilitando a ocorrência de doenças.
Mais ágeis que as autoridades em saúde da região, as endemias e seus vetores estão ignorando as fronteiras do Mercosul.
A esquistossomose desceu do Centro-Oeste e está se instalando nas áreas alagadas pelas represas. A malária, antes controlada até Itaipu, está ameaçando todos os municípios às margens do Paraná. A dengue deverá descer de Minas e São Paulo via Rio Grande e Paranapanema.
A doença de Chagas, já controlada no Brasil, foi recentemente localizada no Paraguai e na Argentina. A leishmaniose, cujo vetor é o cachorro, está surgindo nas vilas que nasceram em função das obras das usinas. A hepatite, a tuberculose, as diarréias e doenças respiratórias vêm aumentando.
São 50 milhões de pessoas afetadas de forma direta ou indireta pelas represas e hidrelétricas. "A Bacia do Prata atinge Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai e Bolívia", diz Jorge Osvaldo Gorodner, da Academia Nacional de Medicina da Argentina e diretor do Instituto de Medicina Regional da Universidad Nacional del Nordeste, em Corrientes (Argentina).
A região -que abriga quase um sexto da população da América do Sul- começa no Pantanal brasileiro e inclui os rios Paranapanema, Rio Grande, Paranaiba, Uruguai, Paraguai, Paraná e Prata.
O impacto das hidrelétricas sobre a saúde das populações dessa bacia foi um dos temas do 33º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, que acontece em Belo Horizonte. Ontem, especialistas fizeram um apelo para que se inicie um programa conjunto de investigação e controle das epidemias. "Estamos pedindo à Organização Panamericana da Saúde que convoque uma reunião de especialistas e submeta os resultados aos ministros da Saúde do Mercosul", disse Gorodner.
"As empresas que construíram as grandes usinas não incorporaram no planejamento os impactos sobre a saúde", diz José Antonio Simas Bulcão, médico sanitarista da Eletrobrás e de Furnas.
Segundo ele, nem o Banco Mundial, cauteloso nos seus financiamentos, define os cuidados com as populações atingidas. Desde 1986, as obras são submetidas à aprovação de um relatório de impacto ambiental, mas, segundo Bulcão, esse estudo não contempla questões de saúde.
Levantamento feito com mil doentes internados na província de Corrientes revelou o aumento das doenças provocadas pelas usinas. "Cresceram a tuberculose, as hepatites e doenças provocadas pelo deslocamento das populações, como a sífilis", diz Gorodner.

Texto Anterior: FNS foi esvaziada, diz coordenador
Próximo Texto: Médico depõe e acusa mais 4 hospitais
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.