São Paulo, quarta-feira, 26 de fevereiro de 1997
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Valorização do dólar

ANTONIO DELFIM NETTO

A valorização do dólar ocorrida ao longo do último ano frente ao marco (11,5%) e ao yen (16%) tem recebido -como de hábito em economia- muitas explicações. Com relação ao marco, a nova moeda, o Euro, que deverá ser introduzida na Comunidade Econômica Européia a partir de 1º de janeiro de 1999, deixa algumas dúvidas. O Banco Central europeu talvez não seja tão virtuoso quanto o Bundesbank, de forma que poderia haver um certo laxismo monetário, principalmente diante do desemprego europeu.
Há, talvez, razões para essa antecipação de uma política monetária menos rigorosa. O esforço que será exigido em 1997 e 1998 para o ajuste fiscal dos países para satisfazerem o limite estabelecido em Maastricht (3% de déficit com relação ao PIB) é imenso, como se vê pela projeções abaixo:
Com o fantástico desemprego existente na Europa, tais cortes de demanda serão altamente perniciosos se não se abrir espaço para um aumento da demanda privada, com uma política monetária mais frouxa. Isso, obviamente, está longe de significar um aumento da inflação, diante da inteira domesticação dos salários que o longo desemprego produziu.
Há, entretanto, alguns claros sinais de fadiga da sociedade européia diante dos imensos custos sociais impostos pela política econômica atual, cujos resultados foram desastrosos no que diz respeito ao crescimento, ao emprego e à solidariedade social. Começam a surgir contestações ao pensamento hegemônico que impôs a política de sacrifícios. As pessoas comuns começam a duvidar de uma "teoria" que afirma que o sacrifício social é a forma de recompensa da boa administração econômica!
A valorização do dólar tem consequências complexas sobre nossas exportações. No último ano, a taxa de câmbio real/dólar foi corrigida em 7,1% (contra uma inflação de 9,1%), enquanto a taxa de câmbio won/dólar foi corrigida em 11,5% (contra uma inflação coreana de 4,5%). As exportações do Brasil e da Coréia para a Alemanha por exemplo, sofreram estímulos completamente diferentes -independentes da valorização do dólar.
Em poder de compra real no Brasil, essas exportações tiveram uma redução de 1,8% (1,071/1,091), enquanto o poder de compra real na Coréia teve um aumento de 6,7% (1,115/1,045). Como as importações alemãs vão se reduzir (este é o efeito da desvalorização do marco), isso significa que a competição Brasil-Coréia vai aumentar naquele mercado, com óbvia vantagem para a Coréia, que poderá suportar um menor aumento do preço em marcos e nos deslocar completamente.
O ponto importante é este: quanto mais resistentes forem os importadores alemães para transmitir a desvalorização para os preços em marcos, tanto maior será a vantagem da Coréia. E não me venham com a história de que nossa produtividade cresceu mais do que a coreana...

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