São Paulo, segunda-feira, 3 de março de 1997
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Para dono do Vetor, CPI acusa sem saber

SILVANA QUAGLIO
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

O presidente do Banco Vetor -liquidado pelo Banco Central há dez dias- Fabio Nahoun, disse que a CPI dos Precatórios não leva em conta critérios técnicos em suas acusações e é um "palco político".
Em entrevista à Folha, sábado no Rio, disse que "não imaginava que se vingariam" no seu banco.
O Vetor fez as operações de vendas de títulos para pagamento de dívidas judiciais (precatórios) em Pernambuco e em Santa Catarina.
As operações estão entre as investigadas pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Precatórios, no Senado. Segundo os senadores, bancos e corretoras lucraram algo entre R$ 400 milhões e R$ 600 milhões com as operações que teriam sido lesivas aos Estados e municípios.
"Mesmo sem uma acusação objetiva contra mim, perdi meu banco. Não pude me defender, mas aguardo ansiosamente pela convocação da CPI", disse.
Nahoun prepara uma ação para pedir indenização. "As justificativas do Banco Central para liquidar meu banco são simplesmente furadas", diz.
O Vetor tinha patrimônio de US$ 40 milhões e não tinha dívidas, quando foi liquidado, segundo Nahoun. Além do Vetor, o BC liquidou o Banco Maxi-Divisa e outras 13 corretoras e distribuidoras, dia 21 de janeiro.
"Eu só fiz a parte técnica das operações e cobrei a comissão de mercado por isso", afirmou. Parte da comissão (R$ 36 milhões), segundo Nahoun, foi para Wagner Baptista Ramos, ex-coordenador da Dívida Pública da Prefeitura de São Paulo, que assessorou o Vetor. Os pagamentos foram feitos para a corretora Perfil, por meio da qual Ramos foi contratado.
*
Folha - Porque o sr. se ofereceu para vender títulos em Pernambuco e Santa Catarina?
Fabio Nahoun - Pernambuco estava com o 13º atrasado, precisava de dinheiro para pagar precatórios e evitar a intervenção no Estado. Já que a Constituição permitia, achei mais adequado para o Estado fazer uma emissão desse tipo, além de ser muito mais barato.
A emissão sairia mais ou menos por um décimo do custo de juros reais para o Estado.
Folha - Mas o governador Miguel Arraes (PSB) procurou o Vetor para isso?
Nahoun - Não. Eles queriam fazer uma ARO (Antecipação de Receita Orçamentária), mas isso é pior para o Estado. Na emissão de títulos estaduais e municipais, você conta com uma rolagem por muito tempo.
Não se fica limitado aos três anos e meio ou quatro anos de prazo médio (validade do papel).
O Senado admite a rolagem. O governador que faz uma emissão dessa sabe que, pelo menos no seu mandato, ele não terá a responsabilidade desse resgate.
Por outro lado, o artigo 33 da Constituição permitiu que os precatórios fossem pagos em oito parcelas e isso será definitivamente suspenso em julho de 97.
Folha - Os governadores aproveitaram a brecha, mas não foi para pagar precatórios...
Nahoun - O que o Estado fez com o dinheiro não é problema meu.
Folha - O Vetor ganhou muito dinheiro. Foram suas operações mais rentáveis?
Nahoun - As operações renderam bem. Ganhei dinheiro contratando com os Estados. Então, tive um faturamento com os Estados e paguei a tecnologia que eu não detinha para a pessoa que eu tinha conhecimento que dominava integralmente a matéria.
Folha - O sr. Wagner Ramos?
Nahoun - O sr. Wagner Ramos.
Folha - Como chegou até ele?
Nahoun - O sr. Wagner Ramos já tinha relações com a empresa porque nós sempre tentávamos comercializar títulos da dívida de São Paulo. Era um relacionamento que se dava da mesa do banco para a mesa da prefeitura.
Folha - Mas a mesa da prefeitura não é o Banespa?
Nahoun - Não. O Banespa faz a liquidação. A coordenação da dívida é quem decide se vai vender o papel. Sabíamos que havia um coordenador da Dívida de São Paulo chamado Wagner Ramos.
Folha - Por que o sr. resolveu contratá-lo?
Nahoun - Porque soubemos que em meados de 95 ele havia assessorado um banco (Maxi-Divisa) do Rio de Janeiro, na parte de tecnologia, para proceder a emissão do Estado de Alagoas.
Folha - Como foi o contrato?
Nahoun - O Wagner quis ser contratado por intermédio da Perfil. O Vetor fez o contrato com a corretora, mas incluiu cláusula exigindo que o Wagner fosse parte integrante da negociação.
Folha - Quanto cada um ganhou?
Nahoun - Em Pernambuco foram colocados R$ 480 milhões. O Vetor recebeu R$ 22 milhões. Pagou R$ 7 milhões para o Banco Boavista, porque havia feito um contrato com eles de garantia para a operação. Pagou R$ 10 milhões para o Wagner. Ganhamos efetivamente R$ 5 milhões.
Folha - E em Santa Catarina?
Nahoun - O governador se interessou quando estávamos terminando a operação em Pernambuco. O processo foi idêntico.
Folha - Poderia ser mais barato?
Nahoun - Santa Catarina tem mais tradição na venda de títulos, mas o governador disse que queria tudo igual. O banco ganhou R$ 33 milhões, lucrando R$ 6 milhões, e Wagner, R$ 26 milhões.

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