São Paulo, terça-feira, 4 de março de 1997
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'As piadinhas me abateram'

MÁRIO MAGALHÃES
DO ENVIADO A SANTA CATARINA

"Olha o vigia, corre que ele vai te pegar". É sempre assim, em qualquer estádio aonde vá Claudiomir.
"Sempre há piadinha", conta. "Tento levar na brincadeira, mas às vezes dá vontade de apelar."
Quando ele foi com o Avaí a Criciúma (202 km ao sul de Florianópolis), cidade onde cresceu, viu um ex-colega zombando: "Tens é que fugir do vigia", gritava.
"Era um conhecido. Isso me abateu, mas queria jogar". Apesar da derrota por 4 a 3, ele ficou feliz: jogou bem e marcou um gol.
Nascido no Paraná, Claudiomir se mudou com 6 anos para Criciúma. Aos 13, para reforçar a receita da família pobre, dirigia uma retroescavadeira e operava uma máquina numa cerâmica.
Claudiomir integrou o time de juniores do Criciúma e tornou-se profissional no Avaí, em 1992.
Subiu aos poucos, virou titular, chegou a voltar ao Criciúma, mas passou a maior parte dos últimos quatro anos no Avaí.
Em 1995, ele viu na TV a notícia de que seu passe fora penhorado para pagar a dívida com o vigia -de cuja fisionomia nem se lembrava. "Um diretor do Avaí me disse que não daria em nada."
Quando a Justiça entregou seu passe ao vigia, Claudiomir continuou no Avaí, assustado com as perspectivas. "Além do mais, o cara se sente até rebaixado, não pode decidir nada, fica sem graça."
Enquanto o Avaí, com contrato com Claudiomir até dezembro de 96, mantinha-o na equipe e brigava com o vigia, a situação do jogador foi se agravando.
Na virada do ano, ele contabilizava sete meses de salários atrasados, além de antigas dívidas. "Ao todo, são R$ 40 mil". O jogador quer ficar no Avaí por acreditar que, assim, receberá os atrasados.
"Uma parte já foi paga", diz o presidente do clube, Flávio Félix, que se recusa a informar quanto.
Sem salário, o pé-de-meia de R$ 7.000 de Claudiomir acabou. Ele aproveitou janeiro para ganhar R$ 500 por jogo num time amador.
"Os dirigentes amadores cumprem o que prometem. São mais profissionais do que os dos clubes profissionais."
Com o futebol, ele comprou casa, apartamento e carro. Em 93, se casou com Eliane, com quem tem a filha Ana Paula, de 1 ano.
Arrependimentos? "Tudo vale a pena porque adoro jogar bola. Sem bola, fico doente. Meu medo é que essa confusão acabe com tudo."
"Eu sinto por deixarem a situação chegar a esse ponto. Se eu fosse um sem-vergonha ou um marginal, até entenderia."
(MM)

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