São Paulo, terça-feira, 4 de março de 1997
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'Preferiria lidar com animais'

MÁRIO MAGALHÃES
DO ENVIADO A SANTA CATARINA

Na juventude, Vidomar Porto laçava gado em rodeios. Orgulhoso do passado, o ex-vigia do Avaí compara, por iniciativa sua, os dirigentes do clube com os animais que perseguia.
"É muito mais fácil lidar com animais. Eles nunca me derrubaram, me respeitavam. Já com essa gente do Avaí..."
É ódio o que ele sente. "Se um animal me dá um coice, é porque não tem entendimento das coisas. Mas um ser humano tem."
Quando foi trabalhar no clube, em 1989, Porto chamava a atenção pela musculatura -pesava 80 kg, 17 kg acima do peso atual, quando, enfraquecido, aparenta bem mais que seus 43 anos de idade.
Ele se sustentava como pedreiro, além de criar vacas e bois na sua casa, em frente ao estádio do Avaí. Mas, como teria carteira assinada, aceitou a proposta de um conhecido, funcionário do clube.
Trabalhar não era problema, estava acostumado. Filho de pai pescador, aos 13 anos já era servente em obras.
Até 1993, porém, foram quatro anos de tensão, com consumo diário de três maços de cigarros.
Primeiro, começaram os atrasos salariais. Irritado, um dia o vigia trancou a rouparia e a lavanderia a chave, impedindo o time de pegar os uniformes para treinar.
Ele trabalhava entre 18h e 6h. Numa madrugada, já sofrendo de doenças renais, desmaiou de dor.
Foi socorrido de manhã pelo massagista Pereirinha, que aconselhou repouso. "E eu vou viver de quê?", indagou o vigia.
Até hoje, ocupado com bicos de pedreiro, não foi ao médico tratar dos rins, mas só de problemas nervosos, agravados com a pendenga judicial com o Avaí. Vidomar Porto só dorme com remédios.
A partir de 1993, quando a pendência trabalhista começou a tramitar, seu casamento se deteriorou, ele se separou da mulher e foi morar na casa de uma irmã. Levou junto o filho caçula, de 2 anos.
Porto quer repassar Claudiomir a outro clube e recomeçar a vida. "Vou aplicar o dinheiro numa coisa que não me incomode."
Com uma mistura do sotaque açoriano (Florianópolis foi colonizada por portugueses dos Açores) e dos pampas do Sul, ele tem a voz aguda, lembrando o personagem Zeca Diabo, do extinto seriado de TV "O Bem Amado".
Porto nunca ouviu falar de leis sobre passe, nem quer aprender. "Só quero saber do que é meu direito, receber pelo que trabalhei. Não é enrolando que um clube se arruma na vida."
(MM)

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