São Paulo, quinta-feira, 13 de março de 1997
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SENHORIO SEM NOBREZA

Ser proprietário de imóveis sempre foi considerado um investimento seguro e de alto retorno. Reforçando essa crença, fatores como a inflação elevada e crônica e a sucessão de planos de estabilização e "confiscos" de rendimentos financeiros levaram muitos a acreditar em imóveis como a melhor opção de investimento.
Depois do Plano Real, a irracionalidade desse tipo de investimento ficou às claras. Embora os aluguéis tenham sido um dos "vilões" inflacionários no período imediatamente posterior à estabilização, mais recentemente o setor passou a vítima. Há por exemplo um evidente excesso de oferta de imóveis para alugar.
A tendência, entretanto, pode ser explicada não apenas pelas oscilações da conjuntura econômica recente, mas também por processos estruturais, de longo prazo.
Os últimos dados demográficos revelam claramente o esgotamento e até mesmo a reversão do processo de migração para os grandes centros, como São Paulo e Rio de Janeiro. É razoável supor que a construção e a locação de imóveis foram excelentes negócios ao longo das décadas em que incharam esses pólos de crescimento. Cessada a onda migratória, automaticamente a oferta de imóveis tende a superar a demanda.
Paradoxalmente, ainda existe uma enorme carência no setor habitacional para a população de baixa renda, constituindo um dos maiores problemas sociais da atualidade nos grandes centros urbanos do país.
A dinâmica urbanística brasileira é outro fator estrutural de desvalorização dos ativos imobiliários. Novos "eixos" surgem, sobretudo de negócios, em intervalos cada vez menores. Os espaços precocemente envelhecidos perdem valor.
Tendências estritamente econômicas também afetam o mercado imobiliário. Da relocalização industrial à racionalização de espaços permitida pela informatização, passando pelo enxugamento de setores importantes como o dos bancos, a economia evolui contra o imóvel. Sem falar nas aplicações financeiras, com sofisticação crescente e a juros ainda altos.
Os senhorios, que até já afetaram algum ar de nobreza na sociedade brasileira, hoje tratam antes de mais nada de passar adiante o "mico".

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