São Paulo, segunda-feira, 17 de março de 1997
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Disse-que-disse

JOSÉ SERRA

Menos reportagens e mais colunas de notas e notinhas: serão assim os jornais do futuro? Serão mais fáceis de ler, sem dúvida, e menos enfadonhos.
Com uma declaração pitoresca numa nota, um caso engraçado em outra e uma intriga inventada numa terceira, as colunas atraem leitores, arejam a cobertura, dão o que falar.
Mas se as notas e notinhas se multiplicam e invadem o espaço das reportagens e dos artigos de análise e, sobretudo, se as colunas, feitas às pressas, não checam as "plantações" de seus confidentes, os jornais podem acabar desinformando mais do que informando.
Leves, porém vazios e pouco confiáveis: serão assim os jornais do futuro?
Na última sexta-feira, numa leitura rápida de seis jornais diários, contei 24 colunas e 378 "tijolos" e "tijolinhos".
Admito: é dura a vida de quem faz jornal diário. Não é fácil encontrar, todos os dias, a manchete que puxe a venda em banca, ou um conjunto de notícias e comentários tão interessantes e originais que justifiquem a assinatura permanente do jornal.
Admito também: as dificuldades cresceram nos últimos anos. A concorrência entre os grandes jornais diários se acirrou, num mercado economicamente e culturalmente encolhido.
As emissoras de rádio e televisão atazanam a imprensa escrita, roubando-lhe a maioria dos "furos" e notícias quentes. A televisão acostumou o público a um noticiário rápido, fragmentário e superficial, induzindo os jornais a imitá-la, comprimindo e simplificando até mesmo suas páginas de opinião e análises.
Enfim, para baixar os custos, as empresas reduziram as equipes de redação e reportagem, ampliando a carga de trabalho e a rotatividade dos jornalistas. Para uma cobertura de maior profundidade, os jornais precisariam de mais profissionais, com mais tempo por matéria e com mais estabilidade e especialização.
As dificuldades têm aumentado, pois o Brasil está se normalizando e deixando para trás o tempo das pautas fáceis quando, num curto período, um presidente morria antes de tomar posse, outro era afastado por corrupção, e o país era sacudido inesperadamente por congelamentos de preços ou por confiscos de poupanças.
O perigo é que, para esquentar suas páginas, os jornais, além da febre de desencavar novos escândalos a cada dia, procurem atiçar polêmicas artificiais ou substituir o noticiário relevante e bem pesquisado por ruídos de bastidores, jogos de adivinhações ou intrigas picantes, mas mesquinhas, como as que frequentam, em "off" é claro, as notas e notinhas de várias colunas.

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