São Paulo, terça-feira, 18 de março de 1997
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Cambial pelo fiscal pode ser rima, mas não solução

LUÍS PAULO ROSENBERG

Os economistas brasileiros que insistem na adoção da maxidesvalorização cambial imediata têm um novo parceiro propondo a mesma solução simplista para a Argentina.
De fato, o economista norte-americano Paul Krugman passou por Buenos Aires defendendo uma máxi, agora que a Argentina atingiu sua maioridade econômica, como prova a estabilização dos preços por mais de meia década.
O ponto dele é que uma desvalorização cambial, ao acelerar a produção interna e desestimular as importações, produziria uma absorção rápida do elevado desemprego existente no país vizinho.
É verdade que está em baixa a opinião de brasilianistas, argentinistas e outros istas que os gringos exportam, em nítida política de dumping sobre nós.
Afinal, Dornbusch por três anos vaticinou que, se não promovêssemos uma maxidesvalorização, iríamos quebrar devido a um atraso cambial de mais de 30%. Neste ano, depois que as exportações cresceram continuamente, ele passou a dizer que uma maxidesvalorização tornou-se impensável no Brasil.
Mas voltemos a Krugman, na Argentina. A lógica de sua proposição é evidente só na aparência: se um país tem no desemprego seu maior problema, por que não eliminá-lo por meio da geração de mais dólares de exportação, crescendo sem pressionar o caixa de divisas? Afinal, trata-se de instrumento tradicional de fomento da atividade econômica até em países desenvolvidos.
A resposta é simples. Se a Argentina tivesse alcançado o nível de desemprego atual como resultado de uma política recessiva, com baixo nível de investimento e cuja escassez de dólares fosse limitante à retomada do crescimento, sem dúvida uma desvalorização cambial promoveria o crescimento sem produzir pressões inflacionárias, dada a ociosidade da capacidade instalada e a sobra de mão-de-obra no mercado de trabalho.
Feliz ou infelizmente, esse não é o caso.
A Argentina está em crescimento acelerado, algo superior a 6%, recebendo investimentos estrangeiros colossais na indústria ligada à agricultura e apresentando um déficit em transações correntes de menos de 3% do PIB.
Nesse cenário, em que a economia cresce aceleradamente e sem restrição por entrada de divisas, uma maxidesvalorização produziria inflação e quebra generalizada dos endividados em dólar, sem fomentar o crescimento.
Exportadores enriqueceriam, trabalhadores veriam o poder aquisitivo dos salários minguar e a economia provavelmente cairia no pior dos mundos: desaquecimento econômico com repique inflacionário.
Lá como cá, desvalorização é sempre proposta como compensação mágica para o ajuste fiscal que nos negamos a efetuar.
Na Argentina, o déficit público é pequeno, o que garante ao governo Menem pelo menos o conforto de que a política econômica deles tem coerência global por chegar perto do melhor desempenho possível. O alto nível de desemprego estrutural é função de anos de fechamento econômico, que só o tempo conseguirá eliminar.
Já aqui, FHC está nos devendo um esforço fiscal significativo desde que assumiu o ministério da Fazenda. Poderíamos estar crescendo muito mais rapidamente, sem necessidade de desvalorizar o câmbio ou de atacar a inércia do Congresso, se o presidente tivesse mantido a mesma situação fiscal deixada por Collor. Não podemos esquecer que ele governou sob esta mesma Constituição e um Congresso bem menos cooperativo do que o atual.

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