São Paulo, sexta-feira, 11 de abril de 1997
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Aonde FHC quer chegar - 1

CELSO PINTO

O governo já definiu aonde quer chegar na área fiscal, neste e no próximo ano, só não sabe com certeza que ajuste terá de fazer para isso.
A intenção -como deixou claro o secretário do Planejamento, Antônio Kandir, na reunião ministerial da semana passada, com a presença do presidente- é obter um superávit primário de todo o setor público (governo federal, Estados, municípios e estatais) de 1,5% do PIB por ano, algo como R$ 12 bilhões neste ano. O resultado primário é o que mede a diferença entre receitas e despesas, sem considerar o impacto dos juros.
É uma meta ambiciosa, especialmente para 98, ano de eleição presidencial. O resultado primário vem piorando sem parar desde 94 e fechou, no ano passado, em equilíbrio (déficit de 0,07% do PIB). O governo federal terá de dobrar seu superávit primário neste ano, de 0,4% para 0,8%. Já fez cortes no Orçamento e, se não conseguir prorrogar o Fundo de Estabilização Fiscal, fará novos cortes no segundo semestre. Aliás, anunciados a todo o ministério, com a bênção de FHC.
Os Estados, municípios e as estatais terão de melhorar suas contas em 0,6% a 0,7% do PIB. Como é mais fácil garantir contas melhores nas estatais, explica-se por que o governo preferiu engordar ainda mais os resultados da Telebrás com tarifas, em vez de comer parte de seu lucro.
Existe uma boa razão para escolher o resultado primário como meta. Ele mede o esforço efetivo de ajuste do governo. A conta de juros pode ser afetada por fatores inesperados. Por exemplo: a necessidade de subir os juros para conter uma deterioração mais forte do que se esperava nas contas externas. A aposta do governo é que o mercado internacional vai olhar o indicador primário com mais atenção e reagir positivamente, se ele estiver caminhando na direção correta.
A meta tem outra razão de ser, explicada por Kandir. O governo acha, sim, que precisa sinalizar ao mercado que conseguirá estabilizar, num futuro previsível, o tamanho do seu endividamento interno (a dívida líquida do setor público) e externo (o passivo externo líquido). O superávit primário de 1,5% em 97 e 98 é o ponto de partida para que isso aconteça.
Não é, contudo, suficiente. Ao lado dele, a Seplan supõe um crescimento de 4,5% tanto em 97 quanto em 98 e uma receita gerada pela privatização de R$ 25 bilhões no conjunto dos dois anos. A privatização ajuda pelos dois lados: alivia a dívida interna (se usada para abater dívida) e atrai investimentos externos (para financiar o buraco das contas externas).
É importante estabilizar a relação da dívida líquida em relação ao tamanho da economia (o PIB), porque isso reduz o risco de uma crise com a dívida interna no futuro. Quanto maior for o estoque e, principalmente, quanto mais rápido ele estiver crescendo, maiores as chances de haver crise futura. O mercado sabe disso e tem visto com preocupação a deterioração dos últimos anos: a dívida líquida saltou de 28,3% do PIB em 94 para 32,5% em 96.
Quando Kandir fala em estabilização, contudo, não quer dizer literalmente isso. A dívida líquida pode crescer por duas razões: o déficit público no ano aumentou ou o governo reconheceu dívidas passadas que estavam camufladas em outras contas -os chamados "esqueletos" fiscais.
Alguns esqueletos foram absorvidos, mas outros continuam soltos, assombrando as contas públicas. Três deles: a maior parte do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), o rombo atuarial dos fundos de pensão estatais (que deve ser imenso) e os custos embutidos na limpeza de estatais antes de sua privatização.
Quando o governo transforma esqueleto em dívida líquida, aumenta o estoque, mas ganha em transparência. Kandir acha que os esqueletos podem, na pior hipótese, fazer a dívida líquida inchar uns 10% do PIB, mas argumenta que o mercado entenderia esse salto como puramente contábil. Importante seria não deixar a dívida crescer engordada por déficits públicos.
Estabilizar o passivo externo é bem mais complicado. Fica para a coluna de domingo.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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