São Paulo, sexta-feira, 11 de abril de 1997
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Papa João Paulo 2º vai usar modelos de estilista de bandas pop

OCTAVI MARTÍ
DO "EL PAÍS"

A vida imita a arte. O próprio papa João Paulo 2º se dispôs a ajudar a transformar em realidade as fantasias expostas pelo cineasta italiano Federico Fellini no filme "Roma", de 1972.
Durante sua próxima viagem à França, que se dará em agosto, por ocasião das Jornadas Mundiais da Juventude, o papa e muitos dos outros participantes vão usar roupas criadas especialmente para a ocasião por Jean-Charles Castelbajac, o estilista dos New York Dolls, banda de glitter rock dos anos 70, conhecida pelas roupas e maquiagem radicais de seus integrantes.
Também o roqueiro John Lydon (ex-Sex Pistols), em algumas ocasiões, conselhos ao imaginativo Castelbajac para a elaboração dos figurinos espetaculares que usa no palco.
Se em "Roma" pudemos assistir a um impressionante desfile de moda para pessoas da Igreja, o que Castelbajac pretende fazer em Paris é organizar uma "coreografia de cores".
O estilista vai desenhar 5.501 roupas, com 25 mil metros de tecido oferecidos pela empresa Chargeurs. Pretende fazer as roupas combinando os tons numa paleta reduzida, para simbolizar os cinco continentes.
Castelbajac evoca sua educação judaico-cristã para explicar a decisão de aceitar o trabalho: "Adoro as idéias de grupo, de celebração e de multidão harmoniosa".
O estilista ganhou fama no interior do mundinho da moda por ser pioneiro nas técnicas de reciclagem e da utilização "desviada" dos materiais.
São célebres, por exemplo, as roupas de esqui que criou em plástico transparente, suas mantas transformadas em casacos e as baetas que viram coletes.
Também se inspira nos quadros de Miquel Barceló e Gérard Garouste para criar seus modelos, que, nesta temporada de outono-inverno, "celebram a feminilidade mais do que nunca".
É fato, pelo menos a julgar por parâmetros como os centímetros de salto alto, reivindicados por Castelbajac pela primeira vez em seus 30 anos de profissão.
Mas o desejo de renovação da Santa Sé não se limita a vestir o papa em roupas de um estilista que está redescobrindo o salto-agulha; ela vai mais além.
O último laureado com o Prêmio Pulitzer de arquitetura, o também francês Christian de Portzamparc, será responsável por criar o espaço em que vai se desenrolar a espiritual dança das cores de que fala o estilista.
Mas os tempos são outros, os patrocinadores também. Talvez no futuro as retransmissões de uma missa sejam interrompidas por comerciais.
Castelbajac observa que "nada mudou na arte sacra desde os anos 60. Por isso, passamos de casulas bordadas a ouro para as vestimentas de bombazina, com um pequeno crucifixo na casa do botão".
Seu papa "roqueiro" vai atualizar a glória antiga dos clérigos, mas não falta quem lamente que tudo isso tenha chegado tarde demais. Um padre com senso de humor comenta: "Wojtyla, no início de seu mandato, quando estava em plena forma física, teria sido um modelo muito melhor. Hoje em dia, sua postura anda um pouco curva".
Mas a idade e a lentidão do andar do papa não parecem preocupar Castelbajac. "Se tivessem me encarregado de fazer a coreografia de um show de rock, eu teria reagido com o mesmo entusiasmo, a mesma preocupação com os detalhes."
É verdade que Fellini, em "Roma", também propôs modelos adequados a cada idade, com saias mais ousadas para as noviças e um centro de gravidade mais baixo para os bispos idosos e trôpegos. Assim, o estilista tem em que se inspirar -uma arte a imitar.

Tradução de Clara Allain

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